quarta-feira, 11 setembro, 2024
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    O término da licença temporária pode prejudicar a reintegração e aumentar a insegurança

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    Perspectiva

    Em ano de eleições, projetos de lei com alta popularidade, mas até então parados nas casas legislativas, retomam sua tramitação, geralmente de forma apressada e sem a devida discussão.

    Esse é o caso do PL 2.253 (conhecido originalmente como PL 583/2011), proposto pelo deputado federal Pedro Paulo (MDB-RJ), que busca eliminar a licença temporária concedida a presidiários.

    Apesar de ter ficado parado por cerca de 11 anos, em 7 de fevereiro esse projeto recebeu do Senado a aprovação de urgência para votação, o que indica que seguirá adiante sem ser discutido pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).

    A decisão de acelerar a tramitação desse projeto, evitando a análise pela CCJ, é particularmente preocupante.

    A CCJ tem um papel fundamental no processo legislativo, pois avalia a constitucionalidade, legalidade e a técnica legislativa dos projetos de lei.

    A ausência de debate nesta comissão priva o projeto de uma análise aprofundada de suas implicações legais e constitucionais, crucial para garantir que as leis aprovadas estejam em conformidade com os princípios fundamentais do ordenamento jurídico brasileiro.

    Além disso, o debate na CCJ oferece a oportunidade para considerar diferentes perspectivas, contribuindo para a formulação de leis mais equilibradas, eficazes e que não violem as garantias fundamentais de todos os cidadãos.

    Antônio Cruz/Agência Brasil

    A morte de um policial militar, baleado em Belo Horizonte em janeiro, reacendeu o debate sobre o tema. O principal suspeito do crime teve permissão para deixar a prisão durante o feriado do Natal e não retornou ao sistema penitenciário.

    Se o PL 2.253/2022 for aprovado, a Lei de Execução Penal (Lei 7.210, de 1984) será modificada para aumentar as situações em que a tornozeleira eletrônica é utilizada, prever casos de avaliação psicológica (atualmente opcional), e eliminar a licença temporária.

    De acordo com as regras atuais, o condenado com pena entre quatro e oito anos tem o direito de solicitar cinco licenças por ano, de até sete dias cada, para visitar familiares, fazer cursos ou participar de outras atividades sociais. Porém, para isso, o detento deve comprovar comportamento adequado, obter autorização do juiz e seguir outros requisitos.

    A licença temporária é uma forma de reintegração social
    Conhecida popularmente como “saidinha”, a licença temporária é um instrumento estabelecido pela Lei de Execução Penal com o intuito de promover a reintegração dos presos à sociedade.

    Esse benefício possibilita que detentos em regime semiaberto, que cumpriram parte significativa de suas penas e demonstraram bom comportamento, possam restabelecer laços familiares e sociais, essenciais para sua reinserção na sociedade.

    A justificativa dada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), relator do projeto, para acabar com esse benefício, ressalta a ideia de reduzir a criminalidade e proteger a sociedade, mesmo que isso signifique violar os direitos do preso.

    No entanto, essa abordagem desconsidera evidências que comprovam o papel crucial das licenças temporárias na redução da reincidência criminal, ao oferecer aos presos a oportunidade de reconstruir suas vidas de modo positivo e produtivo.

    Na verdade, os benefícios das licenças temporárias são diversos, tanto para os presos quanto para a sociedade. Além de fortalecer os laços familiares e comunitários, a reintegração social assistida e gradual dos presos reduz consideravelmente as chances de reincidência.

    Além disso, serve como um estímulo ao bom comportamento dos detentos, uma vez que é um benefício condicionado ao cumprimento de requisitos rigorosos, como bom comportamento na prisão e progressão de regime.

    Em oposição à perspectiva apresentada pelo projeto, organizaçõescomo o Ministério Público Federal, órgãos de defesa popular e organizações da sociedade civil ressaltam a ilegalidade da proposição e advogam pela preservação das licenças temporárias como instrumento de ressocialização.

    O comunicado divulgado por essas organizações enfatiza a baixa taxa de escapadelas relacionadas às saidas, destacando seu êxito como política pública de reintegração social e não como fonte de insegurança pública.

    Além disso, como ressaltado pelo senador Jorge Kajuru (PSB-GO), que apresentou emenda substitutiva, o projeto elimina um mecanismo que contribui para a gradativa reinserção social do condenado e confere o mesmo tratamento ao condenado primário e de bom comportamento, como ao reincidente que comete infrações graves.

    Retrocesso na política de execução penal
    Portanto, a eliminação das licenças temporárias, sem o devido debate e análise, representa um retrocesso nas políticas de execução penal e uma ameaça aos princípios constitucionais que devem nortear o sistema penitenciário.

    A reintegração social dos condenados deve ser o objetivo central da execução penal, conforme estabelecido pela Lei de Execução Penal e pelos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário. Por conta de casos pontuais de mal uso do benefício, tentam generalizar e desacreditar um instituto que tem uma história de sucesso.

    Pelos erros de algumas dezenas querem punir milhares. Seria como proibir a circulação de veículos automotores nas vias por conta do grande número de atropelamentos. Trata-se de uma resposta punitiva meramente simbólica e ineficaz.

    Em síntese, é crucial que haja um debate aberto e fundamentado sobre as implicações deste projeto, com a participação de todos os segmentos da sociedade, incluindo especialistas em direito penal, organizações de direitos humanos e os órgãos do sistema de justiça criminal.

    A proposição de proibição das saídas temporárias subestima a importância deste benefício para a ressocialização dos condenados e para a segurança pública.

    A manutenção e o aprimoramento deste mecanismo, com ênfase na fiscalização e no acompanhamento efetivo dos beneficiados, emergem como alternativas mais alinhadas aos princípios de justiça restaurativa e ao objetivo último da pena: a reintegração do indivíduo à sociedade.

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