segunda-feira, 8 julho, 2024
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    Administração de Lula está marcada por uma série de tentativas de engenhosidade contábil

    Perto de completar seu primeiro ano, a atual gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acumula uma série de tentativas e de possibilidades para a chamada engenhosidade contábil – ou seja, o uso de artifícios contábeis para disfarçar a situação fiscal ou driblar restrições ao Orçamento, abrindo espaço para mais despesas.

    Práticas como essas foram comuns em administrações petistas anteriores, especialmente no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, que acabou perdendo o cargo num processo relacionado às chamadas “pedaladas fiscais”.

    A manobra mais recente foi um dispositivo da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que limita a R$ 23 bilhões o valor que poderá ser contingenciado em 2024. Consultores da Câmara dos Deputados haviam calculado em R$ 56,5 bilhões o total que precisaria ser bloqueado até março, o que afetaria diretamente investimentos públicos e o pagamento de emendas parlamentares.

    O contingenciamento é um mecanismo utilizado para a adequação do resultado primário projetado às metas fiscais estabelecidas, conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

    Para contornar a exigência, o projeto da LDO – já aprovado – passou a blindar vários tipos de despesa do contingenciamento, incluindo todas as que estão excluídas do limite de gastos no novo arcabouço fiscal. O artifício foi incluído pelo relator do projeto, deputado federal Danilo Forte (União-CE), mas atende a uma demanda da equipe econômica do governo.

    Antes da saída encontrada pelo relator, o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), líder do governo no Congresso, apresentara emenda que, de modo geral, proibia o bloqueio de despesas que impedissem crescimento real da despesa primária em 0,6%, conforme estabelecido pelo novo arcabouço fiscal. A sugestão, no entanto, era considerada insegura juridicamente, uma vez que confundia conceitos básicos do Orçamento.

    “Não aceitaremos engenhosidade contábil”, chegou a afirmar Forte no fim de novembro, em entrevista, sem citar diretamente a chamada “emenda Randolfe”.

    Governo quer excluir do resultado primário recursos para Novo PAC

    Ainda no projeto da LDO de 2024, o governo propôs, em agosto, excluir do cálculo do déficit primário até R$ 5 bilhões de despesas de estatais com o Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O dispositivo, inicialmente rejeitado pelo relator, acabou prevalecendo na versão aprovada do texto na Comissão Mista de Orçamento (CMO), após acordo.

    A meta prevista na peça orçamentária para as estatais é de um déficit de R$ 7,3 bilhões. Com a medida proposta pelo Planalto, as empresas podem gastar até R$ 12,3 bilhões sem descumprir a meta, o que, na prática, amplia a capacidade de investimento.

    Outra ideia do Executivo classificada por economistas como tentativa de engenhosidade contábil foi o pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF), no final de setembro, para pagar o acumulado de precatórios postergados durante a gestão de Jair Bolsonaro (PL).

    Isso porque a proposta encaminhada à Corte falava em separar as dívidas em duas partes: o valor principal continuaria classificado como despesa primária, enquanto juros e correções monetárias passariam a ser tratados como despesa financeira, sem impacto no resultado primário.

    “Eu acho louvável o governo tentar resolver e pagar os precatórios postergados. Isso é positivo”, disse Manoel Pires, coordenador do Observatório de Política Fiscal do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV) à “Folha de S.Paulo”, à época. “Mas eu tenho dificuldade de entender os juros do precatório como uma despesa financeira porque decorre de uma despesa primária. Não há operação de crédito nisso”, completou.

    Segundo Marcos Mendes, pesquisador associado do Insper e especialista em finanças públicas, a medida não encontra justificação legal nem contábil. “Se for aprovada legalmente, pode ter um impacto significativo sobre as despesas primárias com juros, para além dos gastos com precatórios”, afirmou à mesma publicação.

    “Além disso, o argumento de que o atraso nos precatórios é uma dívida e, portanto, uma despesa financeira, acaba incentivando atrasos no pagamento dos precatórios no futuro, apenas para classificá-los como despesas financeiras”, acrescentou.

    Ao final da análise, por nove votos a um, o STF autorizou o governo a quitar os precatórios atrasados ainda em 2023, estimados em R$ 95 bilhões, por meio de crédito extraordinário, porém sem a reclassificação contábil das despesas. O gasto não será considerado para efeitos de cumprimento da regra fiscal.

    Valores que também seriam postergados até 2026, conforme emenda constitucional promulgada em 2021, poderão também ser liquidados utilizando o mesmo expediente.

    Fundo financeiro para apoiar estudantes permite manipulação contábil

    Até mesmo o incentivo financeiro para a permanência de estudantes no ensino médio proposto pelo governo abre margem para manipulação contábil. A medida provisória publicada no final de novembro para estabelecer as diretrizes do programa prevê a participação da União no fundo que financiará o programa com até R$ 20 bilhões em recursos na forma de ações de estatais ou aportes diretos.

    Além disso, a partir de 2024, os leilões de petróleo e gás natural poderão estipular que o vencedor faça aportes no mesmo fundo. Tanto o uso de ações quanto os investimentos exigidos de empresas privadas não seriam considerados no cálculo do resultado primário.

    No entanto, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), optou por deixar a medida provisória caducar e, na terça-feira (12), submeteu à votação um projeto de lei, de autoria da deputada Tábata Amaral (PSB-SP), que também estabelece o incentivo financeiro a alunos do ensino médio. A proposta, apresentada em 2021, foi aprovada por votação simbólica e agora segue para o Senado.

    O texto foi aprovado na forma de um substitutivo do relator Pedro Uczai (PT-SC), que deixou para a regulamentação posterior a definição da forma como a União integralizará as cotas do fundo.

    Distorções contábeis começaram ainda na transição

    A primeira distorção contábil surgiu antes mesmo do início do atual governo, na proposta de Emenda Constitucional 32/2022, conhecida como PEC fura-teto ou PEC da Transição, aprovada e promulgada em dezembro de 2022.

    Um dispositivo do texto prevê a transferência de recursos de contas abandonadas do PIS/Pasep para o Tesouro, classificando-os como receita primária. O problema é que, de acordo com o Manual de Estatísticas Fiscais do Banco Central, a operação deveria ser tratada como ajuste patrimonial, o que reduziria a dívida pública, sem impactar a receita.

    Em setembro, a União apropriou R$ 25,98 bilhões esquecidos pelos cotistas dos programas. No Relatório de Avaliação de Receitas e Despesas Primárias (RARDP) do quinto bimestre, a equipe econômica do governo reconheceu o tratamento atípico dos recursos ingressados.

    Conforme descrito pelas autoridades do documento, a diferença de interpretação resultou em uma “discrepância estatística” entre o resultado primário calculado pelo Banco Central naquele mês e o apresentado no relatório:

    “Essa discrepância ocorre devido à inclusão, por parte do Tesouro Nacional, como receita primária, de saldos não reclamados por um período superior a 20 anos em contas do PIS-PASEP, […] enquanto a metodologia de compilação das estatísticas macroeconômicas do setor fiscal adotada pelo Banco Central excluio custo do bilhete do PIS-PASEP da Carência de Financiamento do Setor Público – NFSP, dado que, de acordo com essa instituição, esse valor se encaixa na descrição de ajuste patrimonial e não representa um esforço fiscal no período”, relata o comunicado oficial do governo.

    Lula rejeitou cláusula do sistema fiscal que proibia maquiagem contábil

    Substituto da regra do limite de gastos, o recém-estabelecido sistema fiscal, apresentado pelo governo em março, definiu uma série de despesas que não serão consideradas no limite anual de gastos. Em uma tentativa de impedir a utilização de maquiagem contábil, legisladores inseriram no documento um artigo que impedia a exclusão de despesas primárias do cálculo da meta de resultado primário na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).

    Aprovado pela maioria dos 513 deputados e 81 senadores do Congresso Nacional, o dispositivo foi rejeitado por Lula na aprovação da proposta, convertida em lei complementar nº 200/2023, em 31 de agosto.

    Em uma mensagem ao presidente do Senado e do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o presidente afirmou que a proposta legislativa vai contra o interesse público, uma vez que a LDO seria o documento apropriado para estabelecer e gerenciar as metas de resultado fiscal e, portanto, deve conter a permissão explícita para medidas excepcionais, como a exclusão de despesas do cálculo da meta.

    Lula e, em seguida, os ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, argumentaram que o artigo impediria operações de compensação de dívidas judiciais, que foram utilizadas no Orçamento de 2023, ressaltando que esse tipo de transação pode ser vantajosa para o contribuinte e para a União.

    “A chamada maquiagem contábil causou muitos problemas às contas públicas e à economia recentemente, e este dispositivo atuaria como uma espécie de proteção contra novas tentativas”, comentou o economista Felipe Salto, da Warren Rena, à época. “Ao removê-lo, o governo está enviando um sinal negativo nesse aspecto.”

    No dia 14 do mês passado, no entanto, em uma derrota para o governo Lula, o Congresso rejeitou o veto presidencial ao dispositivo.

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