O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, ofereceu nesta quinta-feira (5.dez.2023) a possibilidade de criação de uma província venezuelana em Essequibo, localizada na Guiana. Atualmente, a área compreende 74% do território guianense e é reivindicada por Caracas.
Em um encontro na Assembleia Nacional, o presidente apresentou um projeto de lei que regulará a criação da Província de Guiana Essequiba e viabilizará a execução das decisões ratificadas pela população em um plebiscito realizado no domingo (3.dez). Os representantes da Casa decidirão sobre a proposta na 4ª feira (6.dez).
O líder venezuelano também instruiu a PDVSA – empresa petrolífera estatal da Venezuela – a conceder licenças para a exploração de petróleo e gás na região.
Em sua conta no X (ex-Twitter), Maduro divulgou o que descreveu como “novo Mapa da Venezuela”, onde a região de Essequibo é apresentada como parte do país.
O plebiscito continha 5 questionamentos, nos quais os venezuelanos escolheram entre as respostas “sim” e “não”. Foram aprovadas pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral) da Venezuela em outubro.
Tratava-se de interrogativos a respeito do Laudo de Paris de 1899 – medida decorrente de um tratado firmado em Washington em 1897, que estabeleceu a área como propriedade da Guiana, que àquela época era uma colônia britânica, e delineou uma fronteira do território.
As perguntas também abordavam o Acordo de Genebra de 1966 – no qual o Reino Unido reconheceu a reivindicação venezuelana de Essequibo e considerou a situação passível de negociação.
Uma delas questionava também a competência da Corte Internacional de Justiça para julgar o caso. O órgão judicial da ONU (Organização das Nações Unidas) em Haia, na Holanda, determinou na 6ª feira (1º.dez) que a Venezuela não pode tomar medidas para anexar o território.
Conforme a decisão, o governo de Nicolás Maduro “deverá se abster de tomar qualquer atitude que possa alterar a situação que prevalece atualmente no território em disputa”.
Leia os questionamentos do plebiscito:
“Você concorda em rejeitar, por todos os meios, conforme a lei, a linha imposta de forma fraudulenta pela sentença arbitral de Paris de 1899, que visa nos privar de nossa Guiana Essequiba?”
“Você apoia o Acordo de Genebra de 1966 como o único instrumento jurídico válido para alcançar uma solução prática e satisfatória para a Venezuela e a Guiana em relação à controvérsia sobre o território da Guiana Essequiba?”
“Você concorda com a posição histórica da Venezuela de não reconhecer a jurisdição da Corte Internacional de Justiça para resolver a controvérsia territorial sobre a Guiana Essequiba?”
“Você concorda em se opor, por todos os meios, conforme a lei, à reivindicação da Guiana de dispor unilateralmente de um mar pendente de delimitação, ilegal e em violação do direito internacional?”
“Você concorda com a criação do Estado Guiana Essequiba e com o desenvolvimento de um plano acelerado de atenção integral à população atual e futura desse território, que inclua, entre outros, a concessão de cidadania e carteira de identidade venezuelana, conforme o Acordo de Genebra e o Direito Internacional, incorporando consequentemente esse Estado no mapa do território venezuelano?”
O governo da Guiana classificou a medida como “provocativa, ilegal, nula e sem efeito jurídico internacional”. Também acusou o líder venezuelano de crime internacional ao tentar enfraquecer a integridade territorial do Estado soberano da Guiana.
O país também defende o Tratado de Washington de 1897. “Durante mais de 6 décadas, a fronteira foi internacionalmente reconhecida, aceita e respeitada pela Venezuela, pela Guiana e pela comunidade internacional como sendo a fronteira terrestre entre os 2 Estados”, disse o governo do país.
A VOTAÇÃO
Conforme o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, pouco mais da metade dos eleitores aptos a votar compareceram às urnas. Foram contabilizados 10.554.320 (dos 20.694.124 totais) no referendo, sem contar com os votos emitidos durante as duas horas finais de votação.
A Venezuela possui 15.857 centros de votação espalhados nos 335 municípios dos 23 Estados do país e na capital.
A votação foi iniciada às 6h do horário local (7h no horário de Brasília) e terminou às 20h (21h no horário de Brasília), pois foi estendida por duas horas.
O resultado oficial do plebiscito será divulgado de 8 de dezembro a 6 de janeiro, conforme estabelece o calendário oficial.
BRASIL
No dia 5 de dezembro de 2023, o Ministério da Defesa do Brasil informou que reforçou a presença militar na região de fronteira no Norte do país, próximo à Venezuela e Guiana.
O aumento do efetivo ocorreu em atendimento a uma solicitação do senador Hiran Gonçalves (PP-RR), que pediu o reforço das tropas em Pacaraima (RR), cidade na fronteira com Essequibo.
Além disso, a secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, Gisela Maria Figueiredo Padovan, declarou que o Brasil acompanha a questão com “atenção” e mantém conversas de alto nível com ambos os países em “busca de uma solução negociada”. Afirmou que o governo brasileiro considera o plebiscito como um “assunto interno do país”.
“A gente não opina. No entanto, a gente sabe que o resultado provavelmente será favorável, porque esse é um tema que une governo e oposição [da Venezuela], talvez o único tema em que os 2 lados estão de acordo. Então, acho que não há nenhuma surpresa se as pessoas responderem ‘sim’ às perguntas”, disse a jornalistas no dia 30 de novembro.
ECONOMIA DA GUIANA
A Guiana possui 214.969 km² e 800 mil habitantes. As línguas oficiais são inglês e idiomas regionais. A moeda é o dólar guianense.
A riqueza do país tem aumentado em decorrência do petróleo na Margem Equatorial. Espera-se que se torne uma nova potência petrolífera na região. A estimativa é que o total de óleo no local seja de 14,8 bilhões de barris. Esse volume corresponde a 75% da reserva total de petróleo do Brasil.
O PIB (Produto Interno Bruto) da Guiana deverá crescer 29% em 2023, segundo projeções do Banco Mundial divulgadas em outubro deste ano. Será o maior desempenho entre os países da América Latina e Caribe. Dados da entidade mostram que o país sul-americano cresceu 43,5% em 2020, 20,1% em 2021 e 63,4% em 2022.
O FMI (Fundo Monetário Internacional) estima crescimento de 38,4% no PIB do país em 2023.
HISTÓRIA
Os primeiroscolonizadores da região chegaram em 1499, sendo os espanhóis. A Guiana passou a ser dominada pelos holandeses durante o século 16. Conforme o Portal Contemporâneo da América Latina e Caribe da USP (Universidade de São Paulo), os holandeses acreditavam que o El Dorado, uma lenda que falava sobre a existência de uma cidade com grande quantidade de ouro, poderia estar na região.
Em Essequibo, o primeiro forte holandês foi erguido em 1616. Este local foi usado como um ponto de comércio administrado pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais. A colônia holandesa, naquela época, se baseava na exportação de açúcar e tabaco.
No século 18, a Guiana expandiu a quantidade de terras agricultáveis ao implementar um complexo sistema de irrigação, o que atraiu colonos ingleses das ilhas caribenhas.
No final do século 18, a população de origem britânica superou numericamente a holandesa na região. Com a expansão da França na Europa e a Revolução Francesa, os holandeses optaram por transferir parte de suas colônias para a administração inglesa, como forma de se precaver contra uma possível intervenção francesa.
Por meio do tratado Anglo-Holandês, as colônias de Essequiba, Demerara e Berbice foram oficialmente transferidas para a Inglaterra em 1814. O território foi renomeado como Guiana Inglesa em 1931. Embora a independência tenha sido declarada em 1966, o país continuou a fazer parte da Comunidade Britânica, um grupo de ex-colônias britânicas.
MADURO
Nicolás Maduro, 60 anos, é o líder da Venezuela e governa de forma autocrática, restringindo as liberdades fundamentais. Ele mantém pessoas presas por aquilo que ele considera como “crimes políticos”.
Relatórios da OEA (Organização dos Estados Americanos) destacam restrições relacionadas à “nomeação ilegítima” do Conselho Nacional Eleitoral por uma Assembleia Nacional ilegítima, conforme a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (de outubro de 2022, novembro de 2022 e março de 2023).