sexta-feira, 28 junho, 2024
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    Aquecimento intenso faz vaca reduzir mais de 30% de leite; e investigação deseja transformar isso


    Condições de elevada temperatura prejudicam a quantidade de leite produzida.

    O Programa de Aperfeiçoamento Genético da Raça Girolando (PMGG) tem se interessado pela resistência dos bovinos às condições climáticas.

    Por essa razão, os índices genéticos dos touros da raça foram estimados levando em consideração o Índice de Calor e Umidade (ICU), que engloba em uma única variável as situações de temperatura e umidade relativa do ar.

    Isso significa que animais mais resilientes ao calor são classificados com maior índice genético para essa característica. Um ICU entre 80 e 89, por exemplo, pode provocar estresse térmico grave no animal. Para isso acontecer basta que a temperatura ultrapasse os 32°C e a umidade relativa do ar esteja em 95%.

    Impulsionado pelas mudanças climáticas e o El Niño, dias de forte calor têm sido comuns em todas as regiões do Brasil, especialmente na região Centro-Sul, onde se concentra a principal produção de leite do país.

    O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) registrou em 2023 nove ondas de calor e, em 19 de novembro, os termômetros da cidade mineira de Araçuaí atingiram a maior temperatura já registrada no Brasil: 48,44°C.

    Nessas condições, bastaria 10% de umidade relativa do ar para que uma vaca estivesse sujeita ao estresse térmico grave, resultando em diminuição na produção, complicações reprodutivas e até mesmo na morte do animal.

    Segundo o cienista da Embrapa Gado de Leite (MG), Marcos Vinícius G. B. Silva, o país perde todos os anos cerca de 30% da produção devido às altas temperaturas. Isso deixa a cadeia produtiva do leite suscetível aos eventos causados pelas mudanças climáticas.

    “A solução para o produtor é desenvolver rebanhos mais resistentes ao estresse-térmico e é isso que o programa de aperfeiçoamento do Girolando tem buscado oferecer por meio das avaliações genéticas e genômicas no teste de progênie da raça”, diz o cientista.

    Silva explica que existem raças mais tolerantes aos efeitos do clima.

    “O gir leiteiro, que compõe a raça sintética girolando, é bastante resistente ao calor se comparada à raça holandesa, que também faz parte do girolando. O resultado do cruzamento das duas raças é um animal resistente e produtivo”, explica.

    Dentro de uma mesma raça há indivíduos mais resistentes que outros.

    Ao longo dos anos, a Embrapa reuniu uma boa base fenotípica de animais resistentes, identificando essa característica dentro da genética do indivíduo.

    Com base nisso, criou-se o PTA (medida de mérito genético do touro) para o estresse térmico, que resultará em vacas mais resistentes.

    A investigação que desenvolveu esse PTA analisou 650 mil controles de produção de leite. Foram coletados os dados no momento da ordenha, identificando a produção da vaca, além do ICU, obtido por meio de estações meteorológicas nos locais onde as propriedades estão situadas.

    “Utilizamos uma metodologia estatística que relaciona esses dados com as genéticas de cada uma das vacas, obtendo o potencial genético do animal”, explica Silva ao contar que esse tipo de abordagem evidencia as diferenças genéticas na resposta dos animais diante das variadas combinações de temperatura e umidade do ar ao longo do período analisado.

    A classificação dos animais em relação ao calor

    Os touros foram classificados conforme categorias de sensibilidade ambiental, que representam o desempenho médio esperado para as filhas de cada touro nas diferentes combinações de temperatura e umidade do ar:

    • Sensível +: touros cujas filhas reduzem a produção de leite em ambientes mais
      quentes e, ou, mais úmidos.
    • Sensível – (menos): touros cujas filhas aumentama produção em ambientes mais
      sufocantes e, ou, mais úmidos.
    • Robusto: touros cujas filhas mantém produções estáveis, independente da
      combinação de temperatura e umidade.
    CAMERA 68Foto DivulgacaoGirolando
    Foto: Divulgação/Girolando

    Silva explica que quando o animal está dentro de uma faixa de ITU considerada adequada, ele terá condições de expressar seu potencial genético, porém, outras condições limitantes, como alimentação, manejo e sanidade, por exemplo, devem estar em níveis adequados.

    O também pesquisador da Embrapa, João Claudio do Carmo Panetto, explica que a categorização dos touros conforme sua tolerância ao estresse caloroso servirá como uma ferramenta auxiliar na seleção dos animais possibilitando o uso de um genótipo mais adequado ao clima das diferentes regiões do Brasil. “Dessa forma, cada criador vai poder direcionar os acasalamentos, visando obter uma prole mais resistente ao estresse térmico, reduzindo as perdas produtivas devidas aos fatores climáticos”, diz Panetto.

    Sumário relaciona prole tolerante ao estresse térmico

    Desde 2022, o Programa de Aperfeiçoamento Genético da Raça Girolando apresenta o PTA de touros com característica para tolerância ao estresse térmico. Naquele ano, o sumário do teste de prole da raça já anunciava 405 touros com essa característica.

    Em 2023, o número subiu para 491 e neste ano serão 549. Esses animais compõe o Índice de Eficiência Tropical, que além da tolerância ao estresse térmico, apresenta características relativas à produção e reprodução. Silva anuncia que, em breve, será incluída neste índice a característica de resistência a ectoparasitas (carrapatos).

    O Sumário traz ainda PTA’s para outras 32 outras características individuais como volume de gordura, proteína, casco, temperamento etc. As características são reunidas em nove índices, apresentando um conjunto de características. Além do Índice de Eficiência Tropical, abarca:

    • Índice de Longevidade do Girolando;
    • Índice de Produção e Persistência na Lactação do Girolando;
    • Índice de Facilidade de Parto do Girolando;
    • Índice de Reprodução do Girolando;
    • Índice de Qualidade do Leite do Girolando;
    • Composto de Produção de Leite e Fertilidade do Girolando;
    • Compostos de Sistema Mamário, de Sistema Locomotor, de Garupa e de Força Leiteira do Girolando

    O PMGG teve início em 1997. Até o ano passado, foram lançados 16 sumários. O Programa conta com 1891 rebanhos colaboradores. Os estudos para incluir a tolerância ao estresse térmico começaram em 2021. “A questão climática é, por si, um marketing natural para venda de sêmen”, diz Silva. Segundo ele, procura pelo sêmen de touros provados para a tolerância ao estresse térmico é grande.

    O pesquisador diz que esse tipo de seleção genômica pode ser extrapolada para outras raças. “Já estamos desenvolvendo estudos para incluir a essa característica no sumário de touros da raça Jersey”, conclui Silva.

    ITU e conforto térmico

    Utilizado em diversas áreas, o ITU combina em uma única variável os valores de
    temperatura e de umidade relativa do ar. Quanto maior o índice, maior será o desconforto térmico de um indivíduo. Na pecuária de leite, o ITU mede o bem-estar dos bovinos em relação ao clima.

    Segundo a pesquisadora da Embrapa Maria de Fátima Ávila Pires, que trabalha com bem-estar animal há cerca de 30 anos, índices abaixo de 72 são considerados confortáveis para a vaca; mas ela ressalta que animais de alta produção já podem ser afetados comíndice de sessenta e oito.

    De setenta e dois a setenta e nove, o ITU é branda; de oitenta a oitenta e nove passa a impactar negativamente no bem-estar térmico da vaca. Acima de noventa, o índice é considerado intenso e pode levar o animal a óbito. A vaca modifica seu comportamento quando está sob pressão térmica. A pesquisadora adverte que o produtor deve atentar para os seguintes indícios:

    • Elevação da frequência respiratória: respiração ofegante pode indicar que o
      animal está tentando dissipar calor;
    • Produção de suor: As vacas podem suar mais quando estão desconfortáveis com o calor;
    • Buscando sombra: sob pressão térmica, vacas podem procurar áreas sombreadas ou mais frescas para se abrigarem do sol;
    • Diminuição na ingestão de alimentos: em condições de calor extremo, as vacas podem diminuir a alimentação;
    • Alterações no Comportamento Reprodutivo: O estresse térmico pode influenciar o cio e a taxa de concepção das vacas.

    “Em regiões com elevadas temperaturas e umidade do ar, o produtor deve adotar medidas para proporcionar um ambiente adequado e confortável para o rebanho, como oferecer sombra, ventilação apropriada, água fresca e aspersão de água”, instrui a pesquisadora.

    Mudanças ambientais

    O ano de dois mil e vinte e três foi o mais quente dos últimos cento e setenta e quatro anos de medições meteorológicas. Conforme a Organização Meteorológica Mundial (OMM), a média global alcançou um vírgula quarenta e cinco °C acima dos níveis pré-industriais. Esse valor está muito próximo de um vírgula cinco °C, estabelecido como limite em dois mil e quinze, no Acordo de Paris e só deveria ser alcançado em dois mil e trinta.

    No Brasil, dados do Inmet revelam que, dos doze meses de dois mil e vinte e três, nove tiveram médias mensais acima da média histórica, com destaque para setembro, com um vírgula seis °C acima.

    Ao longo do ano passado, o País enfrentou nove episódios de onda de calor. Eduardo Assad, ex-pesquisador da Embrapa e um dos pioneiros nos estudos agroclimáticos no Brasil, diretor da empresa de consultoria Fauna, fez uma avaliação da agenda climática em dois mil e vinte e três. Conforme o relatório, a amplitude média dessas ondas de calor foi superior a quatro °C acima da média das máximas.

    Para o pesquisador da Embrapa Ricardo Guimarães Andrade a causa das altas temperaturas de dois mil e vinte e três é o fenômeno El Niño, aliado à crise climática. O fenômeno, que em dois mil e trinta provoca o aquecimento das águas no Oceano Pacífico, se estabeleceu em meados de dois mil e vinte e três e atingiu o auge em dezembro.

    Andrade explica que naquele mês, as águas do Pacífico alcançaram dois °C acima da média histórica. “É um El Niño potente, mas não podemos classificá-lo de ‘Super El Niño’, quando o aquecimento ultrapassa os dois vírgula cinco °C acima da média histórica”, diz. O último Super El Niño ocorreu em dois mil e dezesseis.

    Conforme o pesquisador, o prognóstico climático indica que o El Niño deve persistir até junho. “Há uma probabilidade de cinquenta por cento para que se estabeleça a condição de neutralidade, entre menos zero vírgula cinco °C e mais zero vírgula cinco °C.” Até lá, a temperatura e a precipitação têm a tendência de ficar entre a média e acima da média na região centro-sul do país.

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