segunda-feira, 1 julho, 2024
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    Tribunal Supremo Federal decide que Governo Federal deve criar plano para aprimorar condições dos detidos dentro dos estabelecimentos prisionais

    O governo federal terá que elaborar um plano para aprimorar as circunstâncias das penitenciárias brasileiras, reconhecidas há oito anos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) como ambientes que violam de maneira grave, sistemática e massiva os direitos dos reclusos.

    O Ministério da Justiça, com acompanhamento do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), será responsável pela elaboração do documento. O prazo estipulado para a entrega é de seis meses, a serem contados a partir de outubro deste ano.

    A determinação para a execução desse plano veio do próprio Supremo, em decisão tomada no início do mês passado, a qual confirmou a existência de um “estado de coisas inconstitucional” no sistema carcerário brasileiro.

    Especialistas consultados afirmaram que o diálogo do governo com os estados terá papel crucial na elaboração desse documento, especialmente para equacionar e considerar as diversas realidades locais – a grande maioria dos mais de 830 mil detidos está nos sistemas estaduais.

    De acordo com as análises, o plano também deverá ser realista e viável, com atenção especial para garantir demandas básicas, ainda negligenciadas, como fornecimento de água e alimentação adequados, além de lidar com a superlotação das prisões.

    Um dos desafios apontados pelos especialistas é a necessidade de articulação política por parte do CNJ, que terá que articular soluções que obrigatoriamente passam por dois poderes: o Judiciário (responsável por decretar as prisões) e o Executivo (responsável por manter as prisões).

    Conforme decidido de forma unânime pelo STF em outubro, o plano de aprimoramentos deverá abordar três pontos principais:

    1. Vagas insuficientes e de baixa qualidade no sistema prisional;
    2. Alto índice de encarceramento;
    3. Cumprimento de pena por período superior ao da condenação.

    O plano precisará ser homologado pelo STF e, uma vez aprovado, deverá ser implementado em três anos. Estados e o Distrito Federal também terão que desenvolver planos próprios, alinhados ao documento produzido a nível federal.

    “Melhorias estruturais”

    O policial penal Rafael Velasco, ex-subsecretário de administração penitenciária do Maranhão, é o responsável no Ministério da Justiça por coordenar a elaboração do plano. Em entrevista, ele mencionou que, nessa fase inicial, o foco está em reunir dados para embasar o planejamento. Em 19 de outubro, o ministro da Justiça, Flávio Dino, entregou informações atualizadas sobre a aplicação orçamentária da área ao presidente do STF, Roberto Barroso.

    Segundo Velasco, o ministério está trabalhando em conjunto com outras pastas e órgãos do governo na elaboração do plano, além das secretarias estaduais de administração penitenciária.

    Ele destacou que as principais diretrizes a serem adotadas no documento envolvem “melhorias estruturais”, com destaque para a implementação célere de audiências de custódia e a destinação adequada de recursos do Fundo Penitenciário Nacional para aprimorar as condições das prisões.

    Esses dois elementos já foram objeto de determinação do STF em 2015, quando a Corte reconheceu pela primeira vez o “estado de coisas inconstitucional” no sistema prisional.

    Desafio político

    A advogada criminalista Ludmila Leite, sócia do escritório Florêncio Filho e Camargo Aranha Advogados, destacou que medidas práticas e exequíveis podem ser adotadas para reduzir a elevada taxa de encarceramento no país, controlando o fluxo desnecessário de entrada e saída de pessoas nos presídios.

    Segundo ela, há pessoas que permanecem detidas por período superior ao da condenação. Como exemplo do problema, o mutirão carcerário do CNJ em parceria com tribunais resultou na movimentação de mais de 100 mil processos e na libertação de quase 22 mil pessoas que estavam presas indevidamente, em trinta dias de funcionamento.

    Além disso, existe uma política de encarceramento desproporcional. Leite mencionou a existência de critérios divergentes para a prisão ou manutenção da prisão no país, fruto da independência dos magistrados, o que reforça um viés mais punitivo e contribui para a manutenção em patamares elevados da população carcerária.

    A advogada ressaltou que “o juiz é independente, e alguns se recusam a aplicar teses que já são consagradas”. Acrescentou ainda que “alguns juízes entendem que tráfico é [crime para] regime fechado, independentemente das condições, e decisões sobre furtos e roubos. Isso tem impacto no sistema prisional”.

    Diante dessa situação, o STF aprovou, em outubro, uma súmula de cumprimento obrigatório pela Justiça, definindo condições mais favoráveis para que réus primários por tráfico que não tenham ligação com o crime não cumpram pena em prisões. Esse entendimento já vinha sendo adotado pelo Supremo, mas tribunais do país não o aplicavam.

    Leite apontou que o CNJ terá o “desafio” de organizar o plano elaborado pelos governos, respeitando as peculiaridades regionais, e estabelecer um diálogo com o Judiciário. Ela enfatizou que “o CNJ precisará ser politicamente hábil para criar essa costura, porque são dois poderes diferentes”. “Só vai funcionar se houver alguém muito hábil, e vejo o CNJ como líder nisso, para fazer essa costura, tentando olhar os estados na parte do sistema penitenciário, que é responsabilidade dos Executivos, ao mesmo tempo em que a questão sobre a entrada e saída [de pessoas das prisões] é mais ligada ao Judiciário”.

    O jurista e docente de Direito Constitucional Henderson Fürst argumenta que o plano a ser aprovado precisa ser realizável e que, conforme o que for proposto, serão necessários investimentos.

    “É preferível que seja algo exequível do que algo que não possa ser realizado. E caso não seja, que haja alocação orçamentária”, declarou. “O STF não pode proferir uma decisão que fuja da realidade. Não é viável permanecer como está, mas acreditar que uma decisão transformará completamente a realidade é utópico e corre-se o risco de nada ser feito”.

    Para ele, a resolução do sério problema das prisões passa por reduzir a população carcerária, por meio de uma revisão dos critérios de encarceramento. “Precisamos de soluções contemporâneas para problemas contemporâneos”, afirmou.

    “O aprisionamento é um método de resolução de conflito social que existe desde a Idade Média, institucionalizado como conhecemos. Será que é a melhor solução para os problemas do século 21?”

    Além de sugerir a adoção de punições mais apropriadas e proporcionais, ele também menciona a natureza estrutural da criminalidade, influenciada pela pobreza e pelos níveis de desemprego. “Os países com menor índice de criminalidade no mundo são aqueles em que as pessoas tiveram melhores e mais naturais opções de subsistência”, pontuou.

    O advogado Mozar Carvalho, sócio fundador do escritório Machado de Carvalho Advocacia, afirmou que a situação do sistema prisional brasileiro reflete a complexidade e os desafios políticos que o país enfrenta.

    “Reformar o sistema implica não apenas investir em infraestrutura e pessoal, mas também repensar toda a política de encarceramento”, declarou.

    Histórico

    A situação do “estado de coisas inconstitucional” nos presídios do país foi oficialmente reconhecida pelo Supremo em 2015, em ação movida pelo PSOL.

    Com esse reconhecimento, o Supremo entende haver violações massivas e sistemáticas dos direitos fundamentais dos presos nas penitenciárias brasileiras, devido a problemas estruturais na área e à incapacidade das autoridades públicas de solucionar as péssimas condições das unidades prisionais.

    O instrumento possibilita que o Judiciário intervenha determinando medidas concretas para superar as violações.

    Quando a Corte analisou o caso pela primeira vez, em 2015, foi determinada a obrigação de realização das audiências de custódia em prisões em flagrante (quando o preso é apresentado a um juiz em até 24h para verificar a legalidade da detenção), e a liberação de recursos acumulados no Fundo Penitenciário (Funpen), com o dinheiro devendo ser aplicado em melhorias no setor, e proibindo novos contingenciamentos.

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