quarta-feira, 3 julho, 2024
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    Autorização do Congresso para alienação de terras a estrangeiros protege autonomia nacional



    Interesse coletivo

    O requerimento de aprovação do Congresso para a alienação de terras a estrangeiros protege a autonomia nacional e impede a superexploração do território — uma preocupação global em tempos de supervalorização da produção de alimentos, exploração de minérios e até turismo.

    A defesa do mercado interno e a imposição de restrições às empresas estrangeiras têm chamado cada vez mais a atenção, em um movimento no qual a globalização cede lugar à proteção da segurança nacional. É o que especialistas entrevistados pela revista eletrônica Consultor Jurídico argumentam.

    Reprodução

    O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) encaminhou ofícios em 29 de dezembro à Junta Comercial do Estado de São Paulo (Jucesp) e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) com o intuito de evitar a consumação da alienação da Eldorado Brasil Celulose para a Paper Excellence.

    A medida é resultado de um processo administrativo que determinou que a Paper Excellence deveria ter obtido previamente a autorização do Congresso Nacional, por meio do Incra, para formalizar o contrato de aquisição da Eldorado em 2017. Essa conclusão tem como base a análise das legislações brasileiras sobre aquisição e arrendamento de terras por estrangeiros.

    De acordo com o Incra, a transação representa a alienação da Eldorado, uma empresa nacional com propriedade e arrendamento de imóveis rurais, para a CA Investment Brasil, uma companhia brasileira equiparada a estrangeira, visto que possui como acionistas a holandesa Paper Excellence e a malaia Fortune Everrich. Por isso, o instituto avaliou que a transação requer aprovação parlamentar.

    A aquisição de terras por estrangeiros no Brasil é regulada pela Lei 5.709/1971, que veda a aquisição ou arrendamento de áreas com mais de 50 módulos fiscais por não nacionais. Um município não pode ter mais do que 25% de seu território sob controle de pessoas físicas ou jurídicas de outros países. Cidadãos e empresas de uma determinada nação não podem possuir mais do que 10% da área de um município.

    O artigo 23, parágrafo 2º, da Lei 8.629/1993, estabelece que compete ao Congresso Nacional autorizar tanto a aquisição ou o arrendamento além dos limites de área e percentual fixados na Lei 5.709/1971, por pessoa jurídica estrangeira ou equiparada, de área superior a 100 módulos de exploração indefinida (MEI). Em relação ao caso concreto, o Incra afirma que os imóveis localizados em Mato Grosso do Sul equivalem a 995,503 MEI, acrescentando que “o números [sic] de MEI será maior caso seja computado a área da matricula n 27043 do SRI da Comarca de Andradina – SP e os imóveis arrendados pela empresa Eldorado Brasil Celulose S.A”.

    A exigência de aprovação do parlamento também consta de normas do Incra, como o Manual de Orientação para Aquisição e Arrendamento de Imóvel Rural por Estrangeiro e a Instrução Normativa 88/2017. Por sua vez, o artigo 15 da Lei 5.709/1971 prevê expressamente que a aquisição ou arrendamento “que viole as prescrições desta Lei, é nula de pleno direito”.

    O parecer da Advocacia-Geral da União lançado no mesmo processo administrativo e aprovado pela Subprocuradora-Chefe da Procuradoria Federal Especializada reforça que, uma vez constatado que o negócio foi realizado em desacordo com a legislação vigente, a consequência é a nulidade prevista em lei.
    Apesar dessa determinação expressa, o Incra abriu a possibilidade de uma solução negociada entre J&F — controladora da Eldorado — e Paper Excellence, orientando sobre a possibilidade de as empresas desfazerem o negócio voluntariamente.

    Defesa da autonomia
    Especialistas ouvidos pela ConJur afirmam que a limitação da compra de terras por estrangeiros é uma medida importante para preservar a autonomia do território nacional. Especialmente porque, com o real desvalorizado perante o dólar, o euro e outras moedas,cidadãos do Brasil ficariam em posição de desvantagem em relação a pessoas de outros países no mercado interno, especialmente na área da agropecuária.

    O jurista Lenio Streck avalia que a determinação do Incra está correta. Ele afirma que as ações em andamento no Supremo Tribunal Federal, que buscam a declaração de inconstitucionalidade da Lei 5.709/1971, partem de uma premissa equivocada, já que a Constituição de 1988 não apenas acolhe a norma como também reforça a sua constitucionalidade.

    “Explico: uma vez que a soberania é condição essencial para a existência do próprio Estado, da dignidade humana e de diversos direitos sociais, também deve ser resguardada da falta de proteção estatal. A soberania deve ser protegida. E, simultaneamente, protege. Se o artigo 190 estabelece que a lei reduzirá a aquisição ou o arrendamento de propriedade rural por estrangeiro, a norma ficaria carente da regulamentação constitucionalmente exigida se uma empresa estrangeira pudesse simplesmente evitar as exigências legais”, explica o professor.

    A proteção estatal não pode ser exagerada, aponta Lenio. Por exemplo, o poder público não poderia proibir a compra de terras por estrangeiros em qualquer situação. No entanto, ressalta, o Estado jamais poderia proteger de forma deficiente as áreas nacionais, permitindo que pessoas e empresas de outros países as comprassem irrestritamente. Caso isso ocorresse, “o Estado brasileiro estaria protegendo insuficientemente a soberania, incorrendo, assim, em uma inconstitucionalidade”, afirma o colunista da ConJur.

    Porém, declara, tal exame de proporcionalidade nem é necessário nas ações que correm no STF. “Isso porque a Constituição já estabelece que a soberania tem prioridade em relação aos demais direitos fundamentais conflitantes quando se tratar de aquisição de propriedades rurais por estrangeiros. É uma exigência constitucional: o Estado jamais poderia deixar de proteger a soberania nacional. Soberania significa: aqui tem lei que protege as terras brasileiras. Simples assim.”

    O STF julga ações (ADPF 342 e ACO 2.463) que visam derrubar a limitação à compra de terras por estrangeiros. Os autores argumentam que a restrição viola os princípios fundamentais da livre iniciativa, do desenvolvimento nacional, da igualdade, de propriedade e de livre associação. Afirmam que, ao restringir as aquisições de terras por empresas nacionais com capital estrangeiro, a lei dificulta o financiamento da atividade agropecuária e diminui a liquidez dos ativos imobiliários, com prejuízo para as empresas agrárias.

    As restrições legais à aquisição de terras por estrangeiros são uma opção legítima dos representantes do povo — que é soberano na democracia — para a proteção do território brasileiro, destaca o advogado Walfrido Warde.

    “É uma forma de evitar que o direito de propriedade seja distorcido e utilizado para permitir a ocupação estrangeira do país, ou seja, a compra de grandes extensões de terra por estrangeiros. Todos os países que compreendem que a defesa da soberania é indispensável para a competitividade perante outras nações têm medidas protetivas de seus interesses”, afirma.

    Warde aponta que o sistema de Justiça desses países — que engloba não só o Judiciário, mas também o exercício do poder sancionatório e regulador de órgãos da administração pública — atua deliberadamente para proteger os interesses nacionais perante estrangeiros.

    No Brasil, isso não significa uma afronta aos direitos dos estrangeiros, regulamentados pela Lei de Migração (Lei 13.445/2017), e sim que eles devem se submeter aos interesses nacionais, aos objetivos da nação, analisa o advogado.

    Projeto de lei
    O Senado aprovou, em dezembro de 2020, o Projeto de Lei 2.963/2019, que facilita a aquisição de propriedades rurais no Brasil por pessoas físicas ou jurídicas estrangeiras. A proposta está em tramitação na Câmara dos Deputados.

    terrenos campestres com dimensões inferiores a 15 lotes fiscais (no Brasil, o valor do lote fiscal é estabelecido pelo Incra e varia de 5 a 110 hectares, dependendo do município).

    O Ministério Público Federal emitiu parecer contrário ao projeto. O órgão ressalta que a proposta vai de encontro ao parecer da Advocacia-Geral da União, de 2010, que concluiu que a Lei 5.709/1971 foi compatível com a Constituição de 1988, “especialmente por ser compatível com a garantia constitucional do desenvolvimento nacional e com os princípios da soberania, da independência nacional e da igualdade entre brasileiros e estrangeiros”.

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