Parecer
Com o surgimento da Lei 14.789/23, a discussão sobre a tributação dos auxílios voltou a ganhar destaque no âmbito jurídico, algo plenamente justificável, uma vez que, após uma série de mudanças e o Tema 1.182 vinculante do STJ, essa lei revogou os dispositivos [1] que tratavam da exigência de reserva legal para isenção de IRPJ e CSLL ou traziam a hipótese de não incidência de PIS e Cofins sobre os auxílios no sistema não-cumulativo.
Apesar da compreensível controvérsia acerca da tributação dos auxílios por tais institutos [2], é interessante analisar qual é o real impacto dessa nova lei.
Para isso, destaca-se, inicialmente, a ausência de qualquer dispositivo nesta que categorize, ou seja, dê uma ordem que incline a tributação dos auxílios, seja por IRPJ e CSLL, ou por PIS e Cofins.
O que de fato existe são disposições relacionadas ao novo crédito fiscal de IRPJ em 25% do valor do auxílio [3], bem como a revogação dos dispositivos mencionados anteriormente que, teoricamente, eram os responsáveis pela não incidência. [4]
Dessa forma, como forma de se alcançar o alcance da tributação dos auxílios, é crucial analisar os institutos revogados e, consequentemente, entender se pagamentos como a Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), além do PIS e Cofins no sistema cumulativo, entram nessa equação.
A dúvida, sobretudo, é compreensível, uma vez que se divulgou amplamente que passaríamos a tributar os auxílios fiscais por PIS e Cofins, sem qualquer distinção ou foco para o regime de recolhimento da empresa. Ao mesmo tempo, ao trazer para a CPRB, também é natural pensar que poderia ser afetada, considerando que a base de cálculo inerente a essa contribuição é semelhante à das contribuições sociais, ou seja, a receita bruta.
No entanto, como ficará evidente, não há motivo algum para que haja tal inclusão.
Auxílio de custeio x investimento
Como ponto de partida, é interessante compreender se a diferença entre auxílio de custeio e auxílio para investimento tem alguma relevância na presente análise. Essa observação é necessária, dado o entendimento da Receita Federal na Solução de Consulta 69/2020, onde temos a definição do conceito de faturamento, bem como a orientação de que, no sistema cumulativo, não teríamos a incidência PIS/Cofins sobre auxílios para custeio.
A mencionada Solução de Consulta aborda que o PIS e Cofins no sistema cumulativo devem ter como base de cálculo o conceito de faturamento — compreendido como receita bruta — previsto no artigo 12 do Decreto Lei nº 1.598, de 1977 [5]. Dessa forma, a presente solução de consulta fica restrita a casos de auxílio de custeio, havendo uma lacuna no caso de auxílios para investimento.
No entanto, com base na Lei 14.789/23, temos apenas a revogação dos respectivos incisos da legislação de PIS/Cofins não-cumulativo que proibiam a integração dos auxílios para investimento na base de cálculo dessas contribuições no caso de incidência não cumulativa [6].
Com essa revogação, de fato, temos o aumento da tributação do PIS/Cofins não-cumulativo, devido à inclusão dos auxílios na base de cálculo. No entanto, a Lei 14.789/23 não revogou qualquer disposição de exclusão da base de cálculo de PIS e Cofins no regime cumulativo, o que significa que o entendimento não sofre alterações.A respeito da matéria e, de maneira similar, mantém-se a compreensão da SC n° 69/2020 de não aplicação sobre as subvenções de custeio.
[7], ou seja, o produto da venda de bens ou operações de serviços e as receitas derivadas do objeto principal da empresa.
No caso da CPRB, temos, com base no artigo 7 da Lei n. 12.546/11 [8], como previsão de base de cálculo a receita total e, de acordo com o disposto no artigo 2 da Instrução Normativa nº 2053/21 [9], última publicação sobre o tema, constata-se que o conceito de receita total para fins de CPRB é praticamente idêntico àquele estipulado para o PIS e Cofins cumulativo.
[10], reitera-se, em entendimento firmado pelo STF em sede de repercussão geral, a posição de que é o artigo 12 do DL nº 1.598 o responsável por definir o conceito de receita total para fins de CPRB,
[1] Inciso X do § 3º do art. 1º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, inciso IX do § 3º do art. 1º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003; e o art. 30 da Lei nº 12.973, de 13 de maio de 2014.
[3] Art. 6º A pessoa jurídica habilitada poderá apurar crédito fiscal de subvenção para investimento, que corresponderá ao produtodas receitas de auxílio e da taxa de 25% (vinte e cinco por cento) correspondente ao IRPJ.
[4] Debate acerca do conceito de renda e faturamento é tópico crucial nessa discussão.
[5] Art. 12. A receita total abrange:
I – o resultado da comercialização de produtos em operações por conta própria;
II – o valor da realização de serviços em geral;
III – o lucro obtido em operações por conta de terceiros; e
IV – as rendas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não abrangidas nos itens I a III.
[6] Lei n. 10.637/02
Art. 1. A Contribuição para o PIS/Pasep, com a incidência não cumulativa, é calculada sobre o total das receitas obtidas no mês pela pessoa jurídica, independentemente de sua designação ou classificação contábil.
3oNão são incluídas na base de cálculo mencionada neste artigo, as receitas:
X – de auxílios para investimento, inclusive através de isenção ou redução de tributos, concedidas como incentivo à instalação ou expansão de empreendimentos econômicos e de contribuições feitas pelo poder público;
[7] Reforçando esse conceito de faturamento, temos o início do art. 3 da Lei nº 9.718/98.
[8] Art. 7º Até 31 de dezembro de 2027, poderão contribuir sobre o valor da receita total, excluídos as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, em substituição às contribuições previstas nos itens I e III do início do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991: (…)
[9] Art. 2º Até 31 de dezembro de 2021, as contribuições previdenciárias das empresas que exercem as atividades relacionadas nos Anexos I e IV ou produzem os itens listados nos Anexos II e V recairão sobre o valor da receita total, e será aplicado o disposto:
(…) II – nos Anexos IV e V para fatos geradores ocorridos a partir de 1º de setembro de 2018.
4º A receita total a que se refere o início engloba a receita proveniente da venda de bens em operações por conta própria e da realização de serviços em geral, e o lucro obtido em operações por conta de terceiros, considerada sem o ajuste mencionado no inciso VIII do art. 183 da Lei nº 6.404, de 1976.