Na mesma semana em que o ex-mandatário Jair Bolsonaro foi alvo de ações por parte da Polícia Federal (PF), o líder Luiz Inácio Lula da Silva (PT) demonstrou interesse em se aproximar de três importantes chefes de governo de oposição: Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), de São Paulo; Cláudio Castro (PL), do Rio de Janeiro; e Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais.
À medida que as eleições municipais se aproximam, o petista concentrou sua agenda nos últimos dias em visitar redutos eleitorais de Bolsonaro e prometer que o governo federal apoiará esses estados com recursos federais.
“A responsabilidade do presidente da República não é ficar preocupado com a filiação partidária do governador, mas, sim, empenhado com a população do estado que elegeu aquele governador”, declarou Lula durante cerimônia do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), na quinta-feira (8), em Minas Gerais.
“Já estive com muitos governadores de Minas Gerais. O último foi o companheiro Aécio [Neves, do PSDB], que administrou este estado por oito anos. Depois veio [Fernando] Pimentel [do PT]. Nós não fazemos distinção entre ninguém. O que desejamos é que as obras sejam resultado das necessidades das cidades”, acrescentou.
No evento, o chefe do Executivo anunciou R$ 121,4 bilhões para Minas Gerais. São R$ 36,7 bilhões exclusivos no estado e R$ 84,8 bilhões em obras e ações regionais que abrangem Minas e outras unidades da federação.
A aproximação com Zema pode estar relacionada com a situação do PT em Minas Gerais. Das 853 prefeituras, o partido do presidente possui 29 gestores municipais. Por outro lado, o PL possui 39 prefeituras. Com a vitória sobre Bolsonaro em 2022, conquistar novas prefeituras também significa ampliar uma vantagem eleitoral de Lula em 2026.
De acordo com o cientista político Juan Carlos Arruda, CEO do Ranking dos Políticos, o PT enfrenta a pressão de não liderar nenhuma capital.
“À medida que 2024 se aproxima, surgem as eleições municipais, e o panorama para o Partido dos Trabalhadores (PT) é desafiador. Atualmente, o partido não detém nenhuma prefeitura nas capitais brasileiras, e uma análise do cenário eleitoral revela uma falta de candidatos viáveis nessas áreas metropolitanas”.
Ele acrescentou: “Lula permanece como uma figura emblemática para uma significativa parcela da população brasileira, assim como Bolsonaro. Diante de um cenário eleitoral adverso, é compreensível que ele priorize a agenda doméstica e percorra o Brasil em uma tentativa de impulsionar a performance eleitoral de seus aliados”.
Lula também posou para fotos com Tarcísio e Castro
Ao inaugurar 832 apartamentos do programa “Minha Casa, Minha Vida” em Magé (RJ), na terça-feira (6), o chefe do Executivo também utilizou o discurso do papel institucional do seu governo para se aproximar do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro.
“A gente vai voltar a investir no Rio de Janeiro porque esse estado não nasceu pra ser dominado pelo crime organizado, porque a maioria dos cariocas são gente de bem. Por isso estou feliz de estar aqui”, disse o petista. Além de Magé, ele também visitou a Belford Roxo – outro reduto de Bolsonaro – e almoçou com o prefeito Waguinho (Republicanos).
Nas duas cidades, em 2022, Bolsonaro venceu com a maioria dos votos. No caso de Belford Roxo, seu principal articulador foi justamente Waguinho, que participou de inúmeras agendas de campanha.
A situação da legenda no estado fluminense é considerada dramática: enquanto o PL possui 27 prefeituras, o PT conta com apenas três municípios. Além disso, o partido articula para emplacar o vice-prefeito na chapa de Eduardo Paes (PSD), atual prefeito da cidade do Rio.
Já com Tarcísio de Freitas, em SãoPaulo, emitiu Lula expressou que o governo estadual receberá “toda a assistência necessária” da gestão federal, mesmo sob a liderança de um político de oposição.
“Tarcísio, receberá da Presidência da República todo o apoio necessário, já que não estou favorecendo um governador, mas sim o estado mais importante da federação”, afirmou Lula.
Ambos participaram de um evento que anunciou uma parceria para a realização das obras do túnel submerso que conectará Santos a Guarujá, no litoral de São Paulo. Sendo um projeto do Novo PAC, o empreendimento está avaliado em R$ 5,8 bilhões e terá metade do valor custeado pelo governo federal.
O gesto do petista surpreendeu os presentes, considerando que Tarcísio é um dos principais aliados de Bolsonaro. Por outro lado, a situação do partido em São Paulo também é preocupante: o PT detém apenas 4 prefeituras, enquanto o PL possui 56.
Posicionamentos de Lula refletem a situação municipal do PT
Segundo o cientista político Elton Gomes, professor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), a estratégia do partido é ocupar espaços para ganhar força para as eleições de 2024 e estruturar a legenda para 2026.
“Os acenos têm como grande objetivo o aspecto político-eleitoral, visando as eleições municipais de 2024 e posteriormente as de 2026. Devemos considerar a importância das prefeituras para apoiar candidatos majoritários em nível estadual e federal, como governador e presidente da República”, explicou.
Ele ressaltou que o avanço da direita em diversas partes do país também motiva o PT a investir em redutos de Jair Bolsonaro, especialmente em um momento em que o ex-presidente está fragilizado pelos ataques da Polícia Federal e do Supremo.
“Não é por acaso que São Paulo e Minas são os dois estados onde ele concentra seu esforço. São os dois maiores colégios eleitorais do país e são os estados mais ricos da federação. Isso mostra a dimensão estratégica do comportamento do Partido dos Trabalhadores diante do prognóstico de crescimento do PL e de forças mais ao centro da direita”, afirmou Elton.
Governadores também necessitam do apoio da União
A aceitação dos acenos de Lula pelos governadores não é em vão. Apesar de liderarem os estados mais ricos, também enfrentam graves problemas fiscais. O caso de Minas se destaca entre os três. O estado possui uma dívida de cerca de R$ 160 bilhões com a União e ainda não conseguiu aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RFF) por questões políticas.
A situação do Rio de Janeiro também é semelhante, estando o estado no Regime de Recuperação Fiscal desde 2017. Com quase R$ 180 bilhões em dívidas com a União, Castrou procurou ao longo de 2023 negociar com o Palácio do Planalto a revisão do benefício, alegando que o estado perdeu R$ 5 bilhões com a redução desses tributos.
Estabelecido pela Lei Complementar 159 de 2017, o Regime de Recuperação Fiscal permite que estados em situação de desequilíbrio fiscal usufruam de benefícios como a flexibilização de regras fiscais, concessão de operações de crédito e a possibilidade de suspensão do pagamento da dívida.
Mesmo não estando na mesma situação fiscal que os estados vizinhos, São Paulo irá abrigar obras bilionárias do PAC, como a própria construção do túnel Santos – Guarujá, a expansão da Linha 2 Verde do Metrô (Vila Prudente – Penha – Guarulhos) e a implementação do Trem Intercidades São Paulo-Campinas (TIC). Para isso, o estado precisará contar com recursos provenientes da União, o que leva Tarcísio a buscar uma boa relação com o Palácio do Planalto.