Organizações, legisladores e representantes de setores econômicos atingidos pela decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de não estender a isenção da folha de pagamento antevêem que o cenário econômico do país em 2024 será de instabilidade e sérios prejuízos caso a determinação de Lula se mantenha.
Sem a medida, os 17 setores afetados pelo bloqueio preveem desemprego e incerteza jurídica e afirmam que a retomada do pagamento de encargos terá impacto no aumento de despesas com consequências na inflação.
A isenção está em vigor, porém tem validade até 31 de dezembro deste ano. O projeto vetado por Lula pretendia prorrogar a medida até 31 de dezembro de 2027. Conforme o texto, as empresas isentas pagam uma contribuição que varia de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha dos funcionários.
O bloqueio de Lula ainda será examinado no Congresso. A tendência é que legisladores derrubem a decisão do Executivo na próxima sessão conjunta, que pode ocorrer na terça-feira (28).
Insegurança e inflação
O término da isenção é apontado como fator de influência sobre os preços médios praticados em diversas cadeias produtivas. As empresas alegam que não terão como absorver integralmente os impactos do aumento dos encargos a partir de janeiro de 2024.
Nesta sexta-feira (24), a Confederação Nacional do Transporte (CNT) afirmou que, sem a isenção, os valores das passagens e do frete vão aumentar. Segundo cálculos da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos (NTU), o fim da política tributária deve gerar um acréscimo de 6,78% nos custos totais do serviço, levando, como consequência, a um reajuste médio das tarifas para o passageiro de até R$ 0,31. Atualmente, o valor médio da tarifa nacional está em torno de R$ 4,60 e, portanto, pode ultrapassar R$ 4,91 em razão do veto.
Representantes do setor de serviços digitais, internet e tecnologia da informação também preveem aumento no preço dos serviços. Em nota, eles classificaram a decisão do Executivo como uma “insensibilidade social”.
A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) alertou para “risco sistêmico” com o fim da política. “O aumento da carga tributária sobrecarregará os custos, o que, provavelmente, gerará aumento de preços, impactando a capacidade de consumo da sociedade”, argumentou a entidade.
Risco de desemprego
Ao todo, 17 setores são atingidos pelo bloqueio de Lula. Juntos, eles empregam mais 9 de milhões de pessoas. Segundo representantes de empresas dos segmentos, o fim da isenção põe em risco cerca de 1 milhão de postos de trabalho.
A análise dos dados do mercado de trabalho da política de isenção, comparando os 17 setores isentos com os setores que foram submetidos à retomada de encargos a partir de 2018, demonstra que os setores isentos são capazes de maior geração de emprego. De acordo com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), em dezembro de 2022 os setores isentos alcançaram 8,93 milhões de trabalhadores, e os setores retomados, 6,32 milhões.
Em termos de evolução da empregabilidade, no período de janeiro de 2018 a dezembro de 2022, os setores isentos contrataram mais de 1,2 milhão de novos trabalhadores, o que corresponde a cerca de 15,5% de crescimento, enquanto os setores retomados contrataram pouco mais de 400 mil novos trabalhadores, o que equivale a 6,8% de crescimento. Esses dados são utilizados na justificativa do relatório do projeto de lei vetado por Lula, apresentado pela deputada Any Ortiz (Cidadania-RS).
A isenção também impactou a remuneração dos trabalhadores. Segundo dados da Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação e de Tecnologias Digitais (Brasscom), a iniciativa garantiu, em 2022, aumento de 19,5% na remuneração dos empregados desses setores. Se a folha não tivesse sido isenta, o salário médio desses segmentos seria de R$ 2.033. Com a isenção, a média salarial desses trabalhadores subiu para R$ 2.430.
Sobre o projeto
O projeto da isenção foi aprovado pelo Congresso Nacional em 25 de outubro. Conforme o texto, a contribuição previdenciária patronal sobre a folha de salários é substituída por uma contribuição incidente sobre a receita bruta do empregador. A contribuição patronal é paga por empregadores para financiar a seguridade social.
Em vez de o empresário pagar 20% sobre a folha dos funcionários, o tributo pode ser calculado com a aplicação de um percentual sobre a receita bruta da empresa, que varia de 1% a 4,5%, conforme o setor.
A contribuição é feita, mas passa a se adequar ao nível real da atividade produtiva do empreendimento. Em outras palavras, as empresas que faturam mais contribuem mais. Com isso, é possível contratar mais empregados sem gerar aumento de impostos.
Quais são os setores?
• confecção e vestuário;
• calçados;
• construção civil;
• call centers;
• comunicação;
• construção e obras de infraestrutura;
• couro;
• fabricação de veículos e carroçarias;
• máquinas e equipamentos;
• proteína animal;
• têxtil;
• tecnologia da informação (TI);
• tecnologia da informação e comunicação (TIC);
• projeto de circuitos integrados;
• transporte metroferroviário de passageiros;
• transporte rodoviário coletivo; e
• transporte rodoviário de cargas.