A área da construção civil sempre teve grande importância em nossa sociedade, não apenas pela criação de moradias e infraestrutura, mas também por impulsionar a economia e gerar empregos, sendo um dos setores mais impactantes na economia brasileira. No Distrito Federal, por exemplo, o segmento representa cerca de 56% do Produto Interno Bruto da região.
A relevância da construção civil no dia a dia das pessoas se reflete no grande número de conflitos entre construtores e consumidores que estão em vias de serem resolvidos pelo Judiciário.
No último dia 6 de fevereiro, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) realizou uma discussão importante, sob um novo ponto de vista, sobre a indenização por perdas de lucro (AgInt no REsp 1.881.482/SP) decorrente do atraso na entrega do imóvel ao comprador, em caso de rescisão do contrato.
A novidade que surgiu nesse julgamento foi o voto divergente da ministra Isabel Gallotti, acompanhado pela maioria (3 a 2), estabelecendo o entendimento de que não se pode presumir a existência do prejuízo capaz de obrigar a construtora a indenizar o comprador por perdas de lucro, devido ao atraso na entrega de imóveis comprados na planta, quando o comprador pleiteia a rescisão do contrato.
O relator do caso, ministro Marco Buzzi, havia dado provimento ao recurso especial interposto pela consumidora, revertendo a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo para restabelecer a condenação da construtora ao pagamento de indenização por perdas de lucro, respaldando-se em uma extensa jurisprudência do STJ, que considerava a indenização cabível e dispensava a comprovação do prejuízo, ou seja, presumindo a sua existência.
Ao discordar, a ministra Isabel Gallotti fez uma distinção entre os casos analisados pelo STJ, observando uma variável importante: se o comprador pretende ou não rescindir o contrato.
De acordo com o entendimento da ministra Gallotti, considerar essa variável é essencial para determinar se o prejuízo que dá direito às perdas de lucro pode ser presumido, pois, por um lado, quando o consumidor quer desfazer o negócio (postura negativa), ele deixa de ter a expectativa de receber o imóvel no futuro e, portanto, deve comprovar de forma clara a perda de uma oportunidade ou de valores que deixou de obter legitimamente com a manutenção do negócio imobiliário a ser rescindido.
Por outro lado, a ministra ressaltou que, quando o comprador deseja manter o vínculo contratual (postura positiva), sua expectativa de receber o imóvel é legítima, logo, o prejuízo que ele sofre com o atraso injustificado na entrega do bem é presumível, uma vez que ele continuou arcando com despesas de outra moradia ou deixou de obter renda com o aluguel do imóvel adquirido.
A pequena diferença de votos, 3 a 2, abre caminho para que a questão da presunção desse prejuízo seja discutida em breve também pela 2ª Seção daquele tribunal, que reúne membros das 3ª e 4ª Turmas, formando um precedente qualificado e possivelmente de aplicação obrigatória.
Mais do que isso, a divisão no resultado final do julgamento reflete o alto nível do debate entre os ministros da 4ª Turma, algo salutar e esperado do Judiciário na busca por um consenso social, fornecendo soluções para questões importantes, muitas vezes complexas, que afetam diretamente a vida de consumidores e empreendedores.
O novo entendimento sobre as perdas de lucro tem um impacto positivo para o setor da construção civil, que muitas vezes é afetado por rescisões contratuais.
Nesse contexto, a decisão interpreta a relação jurídica considerando os desafios enfrentados pelo construtor e a necessidade de proteger a relação de consumo, contribuindo para evitar a banalização das rescisões contratuais. O STJ segue na linha de pacificar as relações.