terça-feira, 2 julho, 2024
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    É viável utilizar utilização de arma de fogo para qualificar infracao de subtração e ampliar crime de extorsão?



    Ponto de vista

    Este texto tem o objetivo de apresentar que não existe redundância no emprego da arma de fogo para qualificar a infracao de subtração, do artigo 157, §2º-A, inciso I, do CPB, e agravar o crime de extorsão ou sequestro relâmpago, do artigo 158, caput, §1º ou §3º, do mesmo código legal.

    Com o propósito de facilitar a compreensão do leitor, será sugerido um exemplo fictício, Vejamos:

    No dia 01.01.2023, “A” abordou as vítimas “B” e “C” no veículo de propriedade de “B”, que estava estacionado em frente ao Supermercado “X”. “A”, utilizando-se de arma de fogo, exigiu que “C” realizasse transferências bancárias no montante de R$ 5.000,00 para a conta de “J” sob a ameaça de ser alvejada. Após as transferências, “A” subtraiu para si os objetos de valor das vítimas mediante grave ameaça empregada pela arma de fogo.

    Ao analisar o caso concreto, nota-se que o investigado cometeu dois crimes: a subtração e sequestro relâmpago, dos artigos 157 e 158, §3º, ambos do CPB, em concurso material, do artigo 79 da lei penal.

    É consenso nos tribunais superiores que os crimes de subtração e extorsão, esta, inclusive, na modalidade de sequestro relâmpago (mediante restrição de liberdade da vítima), podem ser praticados no mesmo contexto delitivo, visto que, mesmo protegendo o mesmo bem jurídico (o patrimônio), são cometidos com intenções autônomas [1].

    Não há que se falar em um único crime devido à autonomia de intenções. E também não há caracterização de crime continuado, pois são delitos de categorias distintas, mesmo protegendo o mesmo bem jurídico.

    O entendimento acima é considerado como tese pelo Superior Tribunal de Justiça:

    TESE 3, edição 51: Existe concurso material entre os delitos de subtração e extorsão quando o agente, após subtrair bens da vítima, mediante uso de violência ou grave ameaça, a constrange a entregar o cartão bancário e a respectiva senha para sacar dinheiro de sua conta corrente.

    Precedentes: AgRg no AREsp 745957/ES, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 10/12/2015; EDcl no REsp 1133029/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 22/09/2015, DJe 19/10/2015 [2].

    Para justificar o uso da arma de fogo para qualificar o delito de subtração, artigo 157, §2º-A, inciso I, do CPB, e agravar o sequestro relâmpago, artigo 158, §1º, do CPB, foi utilizada a mesma razão de decidir adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgRg no HC n. 470629 MS, que permitiu a imputação simultânea das agravantes do uso de arma e concurso de pessoas do crime de subtração com as agravantes da quadrilha armada [3].

    Dois delitos associados
    Ao analisar o caso anteriormente mencionado, constata-se que os acusados se associaram com o objetivo específico de cometer crimes mediante o uso de arma de fogo, artigo 288¸ caput e §1º, primeira parte, do CPB, (redação antiga) e praticaram o crime de subtração qualificado pelo concurso de pessoas e agravado pelo uso de arma de fogo, artigo 157, §2º, inciso I, do CPB (redação antiga).

    O Tribunal da Cidadania alegou que não há repetição no mesmo, pois os crimes de subtração e de associação criminosa são autônomos e independentes, uma vez que possuem objetos jurídicos distintos.

    123RF

    A subtração tutela os bens jurídicos do patrimônio, da integridade física e da liberdade do indivíduo, assim como se trata de crime material e de perigo concreto. A conduta típica de associação criminosa (antiga quadrilha ou bando)guarda a tranquilidade pública e é considerado formal e de risco abstrato.

    Aplicando o raciocínio acima ao caso especificado neste artigo, compreende-se que o investigado utilizou a arma de fogo em dois momentos diferentes para cometer delitos distintos e alcançar vantagem econômica ilegal de forma diferente.

    No momento do sequestro relâmpago, a arma de fogo foi usada para restringir a liberdade da vítima como único meio de obter a vantagem econômica ilícita (realização de transferências bancárias para terceiros), situação que configura o delito do artigo 158, §1º e §3º do Código Penal.

    O emprego da arma de fogo pode agravar o delito
    É importante ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça decidiu que o agravante da arma de fogo do §1º do artigo 158 do Código Penal pode ser somado às qualificadoras do crime, inclusive à qualificadora da restrição de liberdade, não se limitando à conduta descrita no caput do referido tipo penal [4].

    Logo após as transferências bancárias realizadas pela vítima de extorsão, o mesmo indivíduo deu início ao ato criminoso de roubo, pois utilizou a arma de fogo para subtrair para si, mediante grave ameaça, os bens de valor das demais vítimas.

    Apesar de os delitos cometidos protegerem o mesmo bem jurídico (patrimônio e integridade física), a consumação ocorre em momentos diferentes, sendo que a arma de fogo foi um instrumento essencial para a consumação de ambos os crimes.

    A extorsão, do artigo 158, caput, do CPB [5] ou o sequestro relâmpago, do artigo 158, §3º, do CPB [6], são delitos formais que se completam com o constrangimento da vítima, utilizando violência ou grave ameaça, a fazer algo contra sua vontade para obter vantagem ilícita ou com a simples privação de liberdade, sendo dispensável, em ambos os casos, a obtenção da vantagem econômica.

    Além disso, o crime de roubo é classificado como crime material e se completa com “[…] a inversão da posse do bem, mediante uso de violência ou grave ameaça, ainda que por pouco tempo e logo após a perseguição imediata ao agente e recuperação do bem roubado, sendo dispensável a posse mansa e pacífica ou desvigiada”, de acordo com a Súmula nº 582 do STJ. [7]

    Portanto, não há duplicidade de punição, uma vez que os delitos praticados são independentes e distintos, principalmente porque se concluem em tempos diferentes, sendo viável utilizar a arma de fogo para agravar o crime de roubo, do artigo 157, §2º-A do CPB, e intensificar o delito de extorsão ou sequestro relâmpago, do artigo 158, caput, §1º ou §3º, do mesmo Código Penal.

     

    [1] BRASIL, STJ – HC: 411722 SP 2017/0199109-3, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 08/02/2018, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/02/2018.

    [2] A Jurisprudência em Tese n. 3, da edição 51 do Superior Tribunal de Justiça está disponível no seguinte link:<https://processo.stj.jus.br/SCON/jt/doc.jsp?tipo=JT&materia=%22DIREITO+PENAL%22.MAT.+NAO+%22DIREITO+PENAL+E+PROCESSUAL+PENAL%22.MAT.&b=TEMA&p=true&thesaurus=JURIDICO&l=20&i=10&operador=E&ordenacao=MAT,@NUM>.Acesso em 14.02.2024.

    [3] BRASIL, STJ – AgRg no HC: 470629 MS 2018/0247772-9, Relator: Ministro FELIX FISCHER, Data de Decisão: 19/03/2019, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/03/2019.

    [4] BRASIL, STJ. 5ª Turma. REsp 1353693-RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 13/9/2016 (Info 590).

    [5] Súmula 96 do Superior Tribunal de Justiça: O delito de extorsão se conclui independentemente da obtenção da vantagem indevida. Disponível em: <https://www.stj.jus.br/docs_internet/jurisprudencia/tematica/download/SU/Verbetes/VerbetesSTJ.pdf>. Acesso em: 14.02.2024.

    [6] STJ – HC: 113978 SP 2008/0185111-5, Relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Decisão: 16/09/2010, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/10/2010.

    [7] Súmula 582 do Superior Tribunal de Justiça: Consuma-se o delito de roubo com a inversão da posse do bem mediante emprego de violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada. Disponível em: <https://www.stj.jus.br/docs_internet/jurisprudencia/tematica/download/SU/Verbetes/VerbetesSTJ.pdf>. Acesso em: 14.02.2024.

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