Um plano articulado foi elaborado pelo STF e PGR, em 2021, com o objetivo de deter um movimento de ameaça à democracia. Na época, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, e o procurador-geral da República, Augusto Aras, tramaram uma estratégia silenciosa que desarticulou uma ação golpista liderada pelo governo de Jair Bolsonaro. Isso impediu a ocupação promovida por grupos de apoiadores do presidente na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, em 7 de setembro daquele ano.
Os detalhes dessa trama foram revelados pelo jornalista Luís Costa Pinto em uma reportagem no site Brasil 247 e em uma entrevista à TV GGN. A estratégia consistiu em pressionar os governos estaduais e o do Distrito Federal para garantir que os policiais militares ficassem recolhidos em suas unidades ou em suas residências entre os dias 6 e 8 de setembro. Isso evitou a adesão de muitos agentes às manifestações golpistas.
Tudo começou em maio daquele ano, quando oficiais de alta patente das três forças militares alertaram a Procuradoria-Geral da República sobre os planos do governo federal. A intenção era forçar o STF a solicitar ao Executivo uma operação de garantia da lei e da ordem (GLO), sob a justificativa de reprimir o movimento golpista convocado por Bolsonaro para o feriado do Dia da Independência.
Era planejado também o apoio das PMs, principalmente do Distrito Federal, de São Paulo e do Rio de Janeiro. Aras recebeu essas informações e percebeu a gravidade da situação. Em seguida, convocou Fux para se reunir com os militares que relataram as intenções golpistas do governo federal. A dupla buscou informações nas Forças Armadas para verificar a veracidade do plano.
Convencidos dos riscos, Fux e Aras se reuniram com o subprocurador-geral de Justiça Militar Marcelo Weitzel, que já havia ocupado o cargo de procurador-geral de Justiça Militar. Juntos, ampliaram as conversas com outros ministros do STF e traçaram a estratégia para desmontar o movimento golpista, contando com a participação dos ministros do Supremo Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.
Weitzel se reuniu com os governadores e comandantes das PMs dos 26 estados e do DF e descobriu que havia risco de adesão dos policiais militares ao movimento golpista. Com isso, o STF e a PGR passaram a articular para que todos os comandantes das PMs decretassem, entre 6 e 8 de setembro, o estado de prontidão, obrigando os agentes a permanecerem aquartelados.
Em agosto, Aras e o então vice-PGR, Humberto Jacques de Medeiros, organizaram uma reunião no STF com Alexandre, Toffoli e os procuradores-gerais de Justiça de todos os estados e do DF. Na ocasião, alertaram os PGJs de que, caso houvesse adesão de policiais ao movimento golpista, a culpa recairia sobre os governadores e comandantes das PMs.
Depois disso, os PGJs convenceram os governadores e comandantes das PMs a instituir o estado de prontidão nas datas combinadas. Essa estratégia foi fundamental para o sucesso da operação.resistência em certos estados, sobretudo em Mato Grosso. O vice-governador, Otaviano Pivetta, que liderava o estado como interino naquele momento, negou-se a interferir na PM. Ele só concordou após Aras ameaçar pedir a detenção de todos os que não seguissem a estratégia.
No Rio, o governador Cláudio Castro, inicialmente, admitiu que não tinha domínio sobre a PM. O líder da corporação fluminense, coronel Rogério Figueiredo, já tinha afirmado que não iria recolher suas forças e que elas iriam para o ato.
Quinze dias antes do Dia da Independência, porém, Castro decidiu substituir Figueiredo pelo coronel Luiz Henrique Marinho Pires. Com isso, a adesão ao ato golpista foi desfeita.
Telefonemas
Já em 6 de setembro, os grupos bolsonaristas começaram a chegar à Esplanada. Eles quebraram os dois primeiros bloqueios feitos pela PM do DF.
Na madrugada do dia 7, Fux dirigiu-se ao STF, instalou-se no gabinete, convocou atiradores de elite das forças de segurança da corte e ordenou que eles se posicionassem na laje do prédio.
Em seguida, o então presidente do Supremo telefonou para o então comandante do Comando Militar do Planalto, general Rui Yutaka Matsuda, e para o então ministro da Defesa, general Walter Braga Netto.
Fux deixou claro que não solicitaria uma GLO (uma operação desse tipo teria de ser concedida por Bolsonaro). O ministro também informou sobre a presença dos atiradores e alertou que mandaria abrir fogo contra os bolsonaristas caso eles quebrassem o terceiro bloqueio policial na Esplanada.
Braga Netto chegou a consultar Aras para saber se Fux podia fazer o que ameaçava. O PGR respondeu que sim e reforçou que a atitude do ministro estava correta.
Fux também telefonou para o governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), que não estava em Brasília. Ele ameaçou intervir na PM e ordenou que o chefe do Executivo distrital fizesse a corporação retirar o povo da Esplanada.
A multidão, então, acabou sendo controlada e o ato foi desfeito.