Documentos confidenciais obtidos pelo periódico Folha de S.Paulo mostram que o atual chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Luiz Fernando Corrêa, foi mencionado em pelo menos quatro relatórios sobre o suposto esquema de espionagem ilegal no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Os detalhes foram divulgados nesta segunda-feira, 11.
Um dos relatórios se refere a Corrêa como “alvo de investigação”. Os documentos fazem parte da investigação sob responsabilidade do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
As decisões públicas de Moraes, até o momento, mencionam apenas posicionamentos da Polícia Federal (PF). Os investigadores suspeitam que a atual administração da Abin tomou medidas que prejudicaram as investigações, mas até aquele momento não havia uma menção direta a Corrêa como investigado.
O ministro também não cita diretamente o atual chefe da agência em suas determinações e se limita a reproduzir, em alguns trechos, as declarações da PF.
Corrêa assumiu o comando da agência em maio de 2023. Ele é um antigo colaborador do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e foi diretor-geral da PF no primeiro mandato do mesmo. Em uma entrevista recente, Lula reiterou manter a confiança no líder da agência de inteligência.
“O camarada que indiquei para ser chefe da Abin é um camarada que foi meu diretor-geral da PF entre 2007 e 2010”, disse Lula, em entrevista à rádio CBN de Recife. “É pessoa em quem tenho muita confiança.”
A Abin está sob investigação da PF desde março do ano passado. Foi quando veio à tona a informação de que a gestão Bolsonaro supostamente utilizou o programa FirstMile para investigar oponentes políticos, via localização geográfica.
Quais são os relatórios da PF que mencionam o líder da Abin?
O primeiro documento é um relatório da Divisão de Contrainteligência Policial, datado de 3 de novembro de 2023, 14 dias após a primeira operação da PF no caso. Ele discute Corrêa e seu antigo segundo em comando, Alessandro Moretti.
O relatório traz a “qualificação dos investigados” com fotografias, data de nomeação na Abin e dados pessoais. O documento destaca que Moretti foi destituído após a segunda operação da PF, em janeiro. Na ocasião, ele informou aos funcionários da Abin que as investigações tinham motivação política.
O segundo documento, de 11 de janeiro, aborda a oitiva de Corrêa na Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência do Congresso, ocorrida em 25 de outubro de 2023.
No relatório, foi referenciada uma nota da União dos Profissionais de Inteligência de Estado da Abin (Intelis), em que a associação critica declarações do diretor-geral da PF sobre “ação institucionalizada de espionagem ilegal”. A Intelis afirmou que “o desvio de poucos não pode ser atribuído à totalidade dos servidores” e defendeu o “uso apropriado” do software FirstMile.
O terceiro documento consiste em uma análise de materiais apreendidos na primeira operação. Foram examinados uma agenda de anotações e um grupo de WhatsApp. Com base no que foi encontrado nos artefatos, a PF concluiu que Corrêa participou de reuniões da diretoria da Abin antes de sua nomeação como diretor-geral.
Já o quarto documento é a análise do celular de Paulo Maurício Fortunato, que foi o terceiro na hierarquia da agência, apreendido na operação de outubro. O relatório apresenta mensagens de um grupo de WhatsApp que estava ativo desde janeiro de 2023, quando o atual diretor-geral já estava escolhido para o cargo.
Corrêa, em uma mensagem de 8 de fevereiro, mencionou que Lula não formalizaria a indicação naquele dia, sugerindo antecipar a preparação das ações de início de gestão. A conclusão foi a mesma do documento anterior: o diretor-geral da Abin participou de reuniões da diretoria antes de sua nomeação.
