terça-feira, 2 julho, 2024
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    Isenção da folha desafia Pacheco a confrontar o governo


    A tensão entre o Congresso e o Planalto aumentou na semana passada com o novo episódio envolvendo a disputa em relação à isenção da folha de pagamento de 17 setores e de municípios. O acontecimento também serve de teste para a parceria entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), um apoiador do governo. Pacheco reagiu prontamente contra a decisão do Planalto de levar à Justiça na quinta-feira passada (25) o impasse sobre o fim ou a continuação do benefício, o que gerou uma série de intensas acusações trocadas nos últimos dias em entrevistas e comunicados.

    Enquanto o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, exige comprometimento do Congresso com a estabilidade fiscal, no sentido de apoio à sua busca por mais fontes de receita, Pacheco exige do governo respeito às prerrogativas parlamentares e desafia a política econômica a equilibrar suas contas pelo lado da despesa. O desfecho desse embate é imprevisível, dada a participação na questão do Supremo Tribunal Federal (STF), que atua em sintonia com o governo e também negocia decisões politicamente, além dos interesses eleitorais tanto do Legislativo quanto do Executivo.

    A decisão provisória concedida pelo ex-advogado de Lula e atual ministro do STF, Cristiano Zanin, suspendendo os efeitos da prorrogação da isenção, cujo impacto é estimado em cerca de R$ 9 bilhões pelo Congresso e em até R$ 15 bilhões pelo governo, está a apenas um voto de ser confirmada pelo plenário da Corte, após ter sido referendada por mais quatro juízes. A decisão está, no entanto, suspensa devido ao pedido de vista feito por até 90 dias pelo ministro Luiz Fux. O Senado recorreu na sexta-feira (26) ao STF e poderá também tomar novas medidas de caráter político após uma reunião de líderes que Pacheco planeja realizar em breve.

    Com a decisão de Fux de requerer mais tempo para análise da decisão de Zanin, o processo de julgamento da ação do governo para acabar com a isenção da folha é temporariamente suspenso. Contudo, alertam especialistas, a decisão provisória continua em vigor. Na prática, as empresas que empregam 9 milhões de pessoas já são obrigadas a voltar imediatamente ao cumprimento das normas do regime tributário convencional. A decisão tem efeito desde abril, o que implica que os pagamentos a serem feitos em maio devem considerar a folha como base de cálculo.

    Nesta semana, o Senado pode analisar duas propostas de interesse do governo. Aprovado pela Câmara na terça-feira (23), o projeto de lei que recria o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) pode ser votado diretamente no plenário da Casa Alta nesta terça-feira (30). Este foi um pedido de Haddad a Pacheco, que pode agora enfrentar resistência. Outra proposta na pauta vinda da Câmara e aguardada pelo Planalto é a que recria o seguro para acidentes em veículos terrestres, o Dpvat.

    Posturas discrepantes sobre equilíbrio fiscal

    Pacheco encontra-se em uma encruzilhada entre os interesses do Legislativo, nos quais se incluem os seus próprios, e as demandas do governo, sobretudo na área fiscal. Após contribuir para mais um adiamento da sessão do Congresso, em favor de Lula, o presidente do Senado se viu surpreendido por uma nova reação do presidente da República envolvendo a isenção da folha.

    Recurrer ao STF era a última alternativa que Lula tinha para barrar a extensão do benefício até 2027. A proposta havia sido aprovada em duas votações nas Casas legislativas e, quando Lula a vetou, os parlamentares derrubaram o veto presidencial. O governo ainda editou uma medida provisória para tributar novamente a folha de pagamento, mas após um período marcado por difíceis e infrutíferas negociações nos bastidores, Pacheco deixou expirar, no início de abril, o trecho da MP referente aos municípios, quepassou de 8% para 20% a tributação sobre a folha de pagamento dos servidores públicos.

    A disputa que se prolonga há meses ganha contornos de crise institucional, pois contraria algo que conta com apoio total do Congresso e encontra o governo inflexível em buscar novas receitas. O vai e vem de decisões entre Legislativo e Executivo sobre o tema alimenta não somente a incerteza jurídica, mas também agrava as já complicadas relações entre governo e parlamentares, concentrada na Câmara e que agora assume contornos difíceis no Senado.

    Impacto eleitoral motiva a resistência de Pacheco

    Segundo analistas consultados pela Gazeta do Povo, Pacheco busca manter benefícios que têm influência direta nas eleições municipais, fundamentais para sua base eleitoral em Minas Gerais, além de atender aos interesses de diversos setores econômicos do país, influentes no conjunto do Congresso.

    Por outro lado, o governo está cada vez mais preocupado com o desempenho das contas públicas e busca fontes extras de receita, além de tentar interromper perdas adicionais com desonerações. O próprio Pacheco é um dos que deseja acrescentar despesas significativas ao Tesouro, por meio da emenda constitucional que institui quinquênios para juízes, “pauta bomba” que deve ser controlada pela Câmara.

    O Judiciário, agora envolvido na questão, enfrenta, por sua vez, crescentes pressões do Congresso, que avalia projetos apoiados por Pacheco no Senado para limitar os poderes de seus ministros e tenta derrubar decisões do STF alinhadas ao governo.

    Até mesmo o risco da instauração de uma CPI para investigar abusos de ministros de Cortes superiores foi colocado sobre a mesa da Câmara. Como pano de fundo estão as eleições municipais e o impacto sobre os setores mais empregadores do país, ameaçando uma onda de demissões e ajustes de preços.

    Governo terá de intensificar diálogo com Legislativo

    Para o cientista político
    Leonardo Gabiati, diretor da Dominium Consultoria, o mais recente atrito entre
    Executivo e Congresso trará problemas no relacionamento entre os poderes. No
    entanto, ele descarta que a situação leve à ruptura. “Não há uma aliança de fato entre
    Pacheco e governo. Existem convergências de interesses e, por isso, há diálogo. O
    presidente do Senado conversa mais com o Planalto e mostra-se mais propenso a
    negociar do que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL)”, explicou.

    Gabiati avalia que Pacheco defende os próprios interesses e os da Casa que preside dentro de uma composição de senadores favorável à negociação com o governo. “São vínculos melhores que os da Câmara, mas que tendem a se tornar mais complexos após a postura claramente crítica de Lula ao decidir judicializar algo que conta com amplo consenso no Congresso”, disse.

    O especialista ressalta que a via judicial não é politicamente ideal, mas institucionalmente possível, logo é parte do jogo. “Por isso, não considero ser uma falha do governo, mas um sinal grave de discordância com o Congresso na questão fiscal, exigindo ainda mais diálogo”.

    Enquanto isso, Lula enfrenta problemas na articulação política e teme ser derrotado novamente em uma sessão do Congresso, que vem sendo adiada desde o início do ano legislativo e que agora está prevista para a próxima semana. O político do PT pode ver anulada a veto de R$ 5,6 bilhões para emendas parlamentares de comissão no Orçamento deste ano.

    A contradição entre governo de esquerda e Legislativo de maioria conservadora gera fatos que reforçam a tese do semipresidencialismo. E a aposta do presidente da República em uma parceria entre Executivo e STF para domar o Congresso apenas amplia esse desgaste. Se a cada derrota em votações apelar para a inconstitucionalidade das decisões dos parlamentares, o Legislativo pode evocar a palavra final que detém sobre a continuidadeno posto dos líderes de governo e de magistrados de tribunais superiores.

    O destino político de Pacheco está em jogo

    Conforme o cientista político André Rosa, docente de Ciência Política na UDF, a rápida ascensão de Pacheco na política revela sua capacidade como negociador nos bastidores, o que se tornou mais evidente ao ocupar os cargos de presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, enquanto deputado novato, e, posteriormente, de presidente do Senado, também em sua primeira legislatura.

    Ele chegou a ser cogitado para concorrer à presidência da República, sem que o mentor da ideia, Gilberto Kassab, presidente do PSD, tenha conseguido levá-la adiante em um panorama nacional ainda bastante polarizado.

    “Agora, especula-se que esse hábil negociador, reconhecido por sua postura diplomática e ponderada, possa ser o postulante ao governo de Minas Gerais com respaldo do Planalto, desafiando o indicado de Romeu Zema (Novo) para assumir o comando do segundo maior colégio eleitoral do país”, ressaltou.

    Os embates ainda estão distantes e serão reavaliados à luz de um cenário mais claro para 2026. “Essa situação dependerá do estado econômico e da popularidade do governo atual, elementos essenciais para uma eventual mudança de rumo”, destacou.

    Ao criarem uma base comum em Minas Gerais para Lula e Pacheco em 2026, o presidente do Senado, o presidente da República e o ministro Haddad uniram forças para pressionar Zema a aceitar os termos de uma renegociação da volumosa dívida do estado com a União, explorando ganhos políticos desse impasse.

    Rosa acredita que Pacheco, como político ainda jovem, de 47 anos, tem potencial para alçar voos mais altos. Contudo, isso depende fundamentalmente da manutenção de sua base de apoio, mais alinhada à centro-direita e bastante abalada por suas posições que desagradam o eleitorado e os grupos políticos mais vinculados ao governo anterior, de Jair Bolsonaro (PL). “Se ele não conseguir concretizar essa pré-condição, correrá o risco de tornar-se apenas mais uma promessa política não cumprida, à semelhança do ex-governador paulista João Doria (PSDB)”, concluiu.

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