sexta-feira, 5 julho, 2024
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    Não convém vulgarizar a emprego do violação de golpe de Estado


    Preceitua o cláusula 359-M do Código Penal ser violação, punido com reclusão de quatro a 12 anos, “tentar depor, por meio de violência ou grave ameaço, o governo legitimamente constituído”. Trata-se do violação de golpe de Estado, o qual visa a punir o agente que tenta destituir do poder quem lá chegou legitimamente. Antes de mais zero, faz-se necessárias algumas observações de cunho histórico e sociológico para melhor compreensão acerca da existência desse tipo penal.

    A história da América Latina tem sido marcada por constantes guerras intestinas, conflitos internos e movimentos armados com finalidade de tomada abrupta do poder. Durante os séculos 19 e 20, tornou-se prática geral a chamada insurreição política ou, sem eufemismos, o golpe de Estado. A sentença vem do francesismo coup d’Etat, fórmula empregada para escolher a tomada de poder por Napoleão no golpe de 18 Brumário, quando oriente, em 1799, assumiu o poder da França, impondo uma ditadura vitalícia no lugar do terror instalado no período pós-Revolução Francesa.

    Inicialmente, de forma dissimulada, substituiu o governo do Diretório por um consulado constituído por três nomes, incluído obviamente o seu, e, logo em seguida, impôs seu governo individual e ditatorial. Golpe de Estado tornou-se, portanto, sentença a denominar todo movimento de subversão da ordem constitucional, toda derrubada de um regime político, em universal, por elementos de dentro do Estado, mediante o trabalho das Forças Armadas ou grupos paramilitares extremamente organizados e muito equipados com armamento pesado.

    Nesse sentido, golpe de Estado pode ser definido uma vez que todo movimento violento de desestabilização da ordem e do regime lítico e legitimamente instalado, contra a ordem constitucional, com o término de impor um novo governo, liderança ou regime político. Está bastante atrelado ao contexto contemporâneo, notadamente em países de frágil segurança institucional localizados na América Mediano, do Sul, África, Oriente Médio e Sudeste da Ásia. De forma universal, cuida-se de fenômeno político de compleição inequivocamente violento, uma ato radical, armada e organizada contra a ordem vigente.

    No caso de Napoleão Bonaparte, além de inaugurar o golpe de Estado uma vez que concepção, iniciou também a tradição da ditadura do tipo bonapartista, na qual um governante assume compleição supremo, enfraquecendo todas as formas de organização política de uma sociedade e governando em relação direta com o povo. Esse caso define, ainda, outra importante propriedade do golpe de Estado, o indumento de que ele está frequentemente ligado ao estabelecimento de uma ditadura.

    O objetivo do golpe de Estado é tomar o poder e derrubar o governo em treino. Importante frisar, porém, que o golpe em si, não é um regime político, não é um governo, mas um movimento violento de queixa da ordem que prepara o caminho para outra forma de governo, em universal, ditatorial.

    Existem várias expressões utilizadas uma vez que sinônimos de golpe de Estado. Na América Latina e Espanha é usual a utilização do termo “pronunciamiento” ou quartelada, que é o golpe militar clássico. Na Alemanha, o mais geral é o uso do verbete “putsch”, primeira tentativa frustrada de tomada do poder pelos nazistas em Munique, liderados por Adolf Hitler.

    No entendimento de Kalina Vanderlei Silva e Maciel Henrique Silva, o concepção de golpe de Estado guarda similaridades com o de revolução. Em geral, ambos se apresentam uma vez que rupturas bruscas e violentas da ordem institucional, sendo seu objetivo, a derrubada violenta do governo para instituição de outro em seu lugar. Há, no entanto, uma diferença entre golpe e revolução. Enquanto a revolução consiste em uma modificação radical das estruturas econômicas e sociais, o golpe, em universal, é exclusivamente a substituição pura e simples das elites no poder, quase sempre levado a cabo pelas denominadas elites orgânicas, ou seja, aquelas inseridas no próprio Estado, uma vez que os burocratas e os militares [1].

    Normalmente, é geral nas narrativas revolucionárias, apresentar o golpe de Estado com um padrão conservador e a revolução uma vez que progressista. Todavia, esse critério não pode ser adotado em compleição inteiro, tendo em vista a existência de inúmeras revoluções com padrão conservador, tal uma vez que a Revolução Islâmica no Irã em 1979.

    O golpe de Estado é característico de sociedades politicamente instáveis, sendo incomum em países com poderoso tradição democrática uma vez que os Estados Unidos e o conjunto ocidental europeu, mais precisamente no último quartel do século pretérito. Nessa abordagem, a maior ou menor ocorrência de golpes de Estado está atrelada à privação de uma cultura política democrática enraizada e instituída na sociedade. Desse modo, países com sólidas instituições democráticas apresentam pequena ou nenhuma incidência de golpes, ao passo que quanto menor for a higidez do sistema democrático, maiores são as ocorrências de tentativa de ruptura da ordem institucional e substituição do governo de vez.

    Depois de contextualizada a questão, passemos à estudo jurídica do tipo penal em comento.  O modo pelo qual o agente procura a destituição do governo deve ser, necessariamente, violento ou com potencialidade real de ser minaz, razão pela qual deverá ser inadmissível qualquer concórdia de não persecução penal, por força do cláusula 28-A do Código de Processo Penal.

    Ressalta-se, nesse sentido, a incompatibilidade entre a sisudez do delito e o tempo estabelecido para sua pena mínima (quatro anos), uma vez que, em tese, ensejaria a possibilidade de regime desimpedido. A ato concreta, para ser equiparada a tão grave violação da ordem constitucional e subversão do regime democrático, aspiração procedente de toda sociedade social sadia, não pode ser vulgarizada para saber qualquer forma de protesto ou revelação violenta. Golpe de Estado somente será a ato organizada e estruturada de forma hierárquica, em regra piramidal, com repartição de tarefas, financiamento adequado e armamento capaz de se contrapor à estrutura de segurança interna e externa do país, leia-se, polícias social, militar e federalista, guardas municipais, segurança interna de prédios públicos e Forças Armadas.

    Golpe de Estado não é sinônimo de baderna, depredação ou movimento político de protesto. Do contrário, será ferida a mens legis, e anarquizado o sistema penal constitucional, pisado na validade e proporcionalidade.

    A sisudez do tipo é tamanha que será o mesmo imprescritível e inafiançável, por força do cláusula 5º, XLIV da Constituição, que serve de fundamento ao tipo lítico. Diz o referido mandamento constitucional: “Constitui violação inafiançável e imprescritível a ato de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”.

    O texto constitucional é demasiadamente simples ao exigir a existência de grupos armados e obviamente organizados com estrutura para investir contra a ordem constitucional e o Estado Democrático de modo definitivo. Não se trata de mera turbação episódica da ordem, por mais grave que seja, sendo imprescindível dois elementos, um de ordem subjetiva e outro de natureza objetiva.

    O primeiro consiste no animus, ou seja, no dolo de realizar a ato com vista a derrubar o governo legitimamente constituído. No entanto, o Justo Penal não se contenta com a intenção, sendo necessária a conduta real, concreta e efetiva que coloque em risco o muito jurídico tutelado. Trata-se do brocardo “pensiero non paga gabella” e “cogitationis poena nemo patitur”.

    Querer dar o golpe de Estado não basta. Iniciar uma ato tresloucada ou desesperada de protesto violento contra o governo legitimamente instalado não é suficiente. O elemento objetivo do tipo exige a ato de pelo menos um grupo armado, estruturado, organizado e fortemente armado a ponto de colocar em risco a resguardo da ordem constitucional e do regime em vigor pelas forças de segurança e resguardo institucional instaladas.

    A objetividade jurídica do delito é a Resguardo do Estado democrático de Justo e a soberania do voto popular. Por tratar-se de violação geral, qualquer pessoa poderá ser o sujeito ativo. Uma vez que sujeito passivo direto figurará o Estado, atingindo indiretamente todos os membros da coletividade.

    Pune-se o golpe de Estado, consistente na tentativa de deposição violenta ou ameaçadora de governo legitimamente constituído. No que tange à imprecisão quanto ao termo “golpe”, diz Rogério Sanchez Cunha e Ricardo Silvares: “É verdade que a termo golpe tem sido impropriamente usada em nosso meio político em tempos mais recentes. A presidente da República eleita em 2014 sofreu, ao longo de 2016, longo e público processo de impeachment por violação de responsabilidade, por meio do qual perdeu o função, mantendo seus direitos políticos, mas, ainda assim, alegou ter sofrido um golpe; o presidente que a sucedeu foi fim de ações penais promovidas pelo Procurador-Universal da República, com ampla publicidade e correto de resguardo, mas também alegou ser vítima de uma tentativa de golpe” [2].

    Presentemente, com o domínio dos meios de notícia e a manipulação retórica de expressões jurídicas para a consecução de fins políticos, a guerra de narrativas torna a verdade menos relevante, com graves consequências para a segurança e a previsibilidade na emprego do jus puniendi.

    O tipo penal pune a tentativa de deposição, ou seja, a ato violenta, armada e organizada de um grupo social ou militar que tenha real capacidade para derrubar, refaixar, do treino das funções, antes do final do incumbência, com violência ou grave ameaço, o governo legitimamente constituído. Não havendo mostra desta efetividade, estaremos diante da chamada tentativa ineficaz, inadequada, quase violação ou violação impossível, quando a produção do resultado típico é impossível, seja pela ineficácia absoluta do meio ou pela impropriedade absoluta do peça.

    Por referir-se ao golpe de Estado, entendemos que o tipo se aplica exclusivamente à deposição do governo na esfera da União, vez que a sentença é utilizada para deposição de superintendente de Estado enquanto pessoa jurídica de correto público internacional. Demais, por mais que ocorra, hipoteticamente, a deposição violenta de um prefeito ou de um governador de Estado, estaríamos diante de uma situação extraordinário de uma quebra da ordem lítico, mas não de um golpe de Estado, pois mantida a legitimidade do presidente da República, oriente ainda pode valer-se de mecanismos legais e constitucionais para a remontagem da ordem perdida no estado federativo ou município.

    O elemento subjetivo do tipo é o dolo, consistente na vontade livre e consciente do agente em tentar depor, mediante violência ou grave ameaço, governo legitimamente constituído. Somente é provável o dolo direto, não se vislumbrando a possibilidade de dolo eventual. O delito se consuma no momento em que o agente inicia a ato concreta e viável objetivando a derrubada do governo legitimamente eleito, lembrando sempre que a ato inviável caracteriza violação impossível. Exige-se, portanto, a prática de atos concretos, violentos ou ameaçadores, aptos a depor o governante maior na região. Importante salientar que a tentativa deve ser factível, real, revestida de possibilidade de vitória, não se aplicando para meros discursos, disseminação de ideias ou atos de ínfima sisudez, que não, de concórdia com as condições de tempo e lugar, lesionariam a constitucionalidade do governo do país.

    Por ser violação de atentado, a tentativa é prevista uma vez que a própria conduta típica, não se aplicando, portanto, o cláusula 14, parágrafo único, do Código Penal. O violação é formal, não se exigindo qualquer resultado naturalístico para sua feitio, que no caso, seria a deposição do governante legitimamente eleito. Trata-se de violação de ato penal pública incondicionada.

    Finalmente, mencionamos que o tipo sob estudo guarda certa similaridade com o revogado cláusula 17 da Lei de Segurança Vernáculo, que dizia: “Tentar mudar, com trabalho de violência ou grave ameaço, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Justo”. Nota-se que o cláusula 17 fazia menção à ruptura do regime vigente, vocábulo comumente utilizado em contexto militar para se referir ao governo. Desse modo, o tipo visava a punir o ato de tentativa violenta do governo, caracterizando verdadeira ininterrupção típico-normartiva, exclusivamente com a mudança da reprimenda. O delito é um dos mais graves por ameaçar seriamente a própria democracia, porquanto não convém vulgarizar sua emprego

    Fernando Capez é procurador de Justiça do MP-SP, rabi pela USP, doutor pela PUC, responsável de obras jurídicas, ex-presidente da Plenário Legislativa de SP, presidente do Procon-SP e secretário de Resguardo do Consumidor.

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