sexta-feira, 5 julho, 2024
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    Plano de incentivo à indústria do governo Lula é reinterpretação de equívocos


    O plano de incentivo à indústria brasileira divulgado pela administração de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), nesta segunda-feira (22), apresenta uma “reinterpretação” de medidas anteriores e evidencia um “diagnóstico equivocado” sobre as origens do problema da falta de competitividade do setor industrial, de acordo com economistas consultados pela Gazeta do Povo.

    Com previsão de R$ 300 bilhões em financiamentos e subsídios ao setor até 2026, a política industrial abrange seis áreas de estímulo ou “missões”, com metas e diretrizes para a próxima década, colocando o Estado como incentivador do desenvolvimento.

    “Apesar de ter aspectos positivos, esta visão chama mais atenção. A própria experiência brasileira deveria ter deixado claro que o Estado como impulsionador do crescimento industrial se mostrou uma política ineficaz,” afirma Gabriel Fongaro, economista sênior do Julius Baer Brasil. “Gasta-se muito dinheiro e não há evidência de um impacto positivo estrutural que supere os custos”, completa.

    Juliana Inhasz, economista do Insper, avalia que o plano é uma releitura de coisas que já foram feitas, com viés protecionista, sem considerar a competitividade e produtividade das empresas ao longo do tempo.

    “Eu acho que nesse ponto fica evidente a percepção de que a gente está fazendo mais do mesmo, né? A gente já fez isso, né? O governo já concedeu recursos para vários tipos de indústria, com juros subsidiados. E onde a gente está? Fazendo de novo as mesmas coisas que não deram certo”.

    Mercado vê risco fiscal; Lula não demonstrou preocupação

    O mercado financeiro reagiu negativamente ao anúncio do plano. O dólar subiu e o Ibovespa caiu na segunda-feira (22), refletindo as preocupações dos agentes com o impacto fiscal das medidas e com o possível aumento da inflação, o que impediria o Banco Central de manter a trajetória de redução dos juros.

    Na avaliação de Inhasz, o governo Lula não está atribuindo a devida importância às contas públicas. “É um grande aporte que será feito sem eventualmente uma grande preocupação fiscal, né? O presidente deixou muito claro que ele não está preocupado com a situação. O provável é que os financiamentos se deem por endividamento público”.

    O presidente Lula declarou na segunda-feira, referindo-se aos ministros que seriam cobrados por resultados, que dinheiro “não era o problema”. “O problema não termina aqui, ele começa aqui. Nós temos mais três anos pela frente. O nosso problema era dinheiro, se dinheiro não é problema, então nós temos que resolver as coisas com muito mais facilidade”, disse Lula.

    Fongaro corrobora a preocupação. “Num contexto de necessidade de um ajuste fiscal estrutural da ordem de 3% do PIB, qualquer política que implique aumento de gastos públicos deveria passar por um escrutínio rigoroso”, diz.

    Segundo o governo, dos R$ 300 bilhões destinados, R$ 271 bilhões virão de financiamentos com juros subsidiados, R$ 21 bilhões de créditos “não-reembolsáveis” e R$ 8 bilhões serão gastos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para comprar participações acionárias em empresas, reproduzindo uma política de outras gestões do PT e contrariando o movimento anterior do governo, de Jair Bolsonaro (PL), que estimulou o desinvestimento nessas empresas.

    Felipe Novaes, economista e analista de Indústria na Tendências Consultoria, destaca que o governo ainda não definiu como serão viabilizados esses aportes via BNDES. O ponto principal, para ele, é a definição de uma estrutura de governança do programa apresentado.

    “Existe uma opacidade em relação à governança e às métricas que vão nortear os mecanismos via empréstimos do BNDES e também as compras governamentais”, disse. “Ogoverno estabeleceu muitas metas de aspiração, mas não estabeleceu métricas cruciais para reduzir o risco de apropriação indevida de benefícios por grupos exclusivos em prejuízo de outros, como ocorreu no passado.”

    Na história mais recente, essa situação tornou-se bastante evidente, ressalta Novaes, lembrando que os estímulos fornecidos às empresas dentro do programa serão financiados pelos contribuintes. “A sociedade arca com essas políticas por meio de isenções, subsídios e taxas de juros subsidiados. Já vimos em experiências anteriores que nem sempre os retornos foram determinados”, acrescenta.

    Política para conteúdo local é questão central

    Um dos pontos de concordância entre os economistas é a crítica à política de “conteúdo local”, que estabelece uma proporção de investimentos nacionais que devem ser aplicados na produção de determinado bem ou serviço.

    No plano de reindustrialização apresentado pelo Executivo, as empresas nacionais serão beneficiadas com linhas de crédito com condições favoráveis para assumir obras do Novo PAC. Também terão prioridade nas compras governamentais e na mecanização da agricultura familiar.

    O governo também deverá dar preferência para produtos manufaturados e serviços nacionais ou locais, mesmo que o preço supere o de itens importados concorrentes até um percentual previamente estabelecido.

    “A noção de conteúdo local representa um problema, pois também gera o protecionismo, o que pode ser bastante complexo para promover uma indústria eficiente e produtiva”, afirma. “Ao garantir mercado para empresas sem competitividade, o governo acaba recompensando a ineficiência”, completa.

    Para Fongaro, a política de conteúdo local vai contra o desenvolvimento industrial pretendido pelo governo. “Reserva de mercado faz com que empresas pouco competitivas sobrevivam e é um dos motivos para o baixo crescimento potencial de um país”, diz o economista da Julius Baer. “Para uma indústria ser eficiente, ela precisa ter acesso aos melhores insumos, ao melhor custo possível. Naturalmente, muitos deles estarão em outros países. Estar inserido na cadeia global de produção é crucial para desenvolver o setor industrial”.

    Políticas equivocadas, segundo Fongaro, tendem a acarretar maiores custos e menor qualidade para os insumos da cadeia produtiva e, consequentemente, um efeito inflacionário. O governo, acredita o economista, ajudaria mais criando condições para taxas de juros baixas de forma sustentável e um ambiente de negócios mais favorável, com maior segurança jurídica e tributária à indústria. “Não adianta gastar R$ 300 ou R$ 500 bilhões se os recursos forem mal aplicados. Quando o dinheiro acabar, a indústria continuará sem conseguir andar com as próprias pernas”, finaliza.

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