Estudiosos constataram que a vírgula decimal é 150 anos mais antiga do que se acreditava ao depararem-se com registros italianos do século XV que demonstram o uso da separação de números em décimos. Esse conceito matemático, embora hoje pareça simples e óbvio, nem sempre esteve presente, tornando o trabalho daqueles que realizavam cálculos muito mais complicado em épocas passadas.
Diferentes formas de divisão decimal surgiram ao longo da história, como nos escritos de matemáticos em Damasco, por volta do ano de 900 d.C., ou durante os anos 1200 d.C., por estudiosos chineses. No entanto, um sistema consistente de vírgulas decimais só foi firmado em 1593, com o matemático alemão Cristóvão Clávio – ou ao menos era isso que se acreditava.
A criação da vírgula decimal
Parece que Clávio estava desenvolvendo seu sistema decimal a partir de um antecessor, Giovanni Bianchini, um comerciante veneziano do século XV que publicou tratados de astronomia e astrologia entre 1441 e 1450. Sua obra é pelo menos 150 anos mais antiga que a de Clávio, e não poderia ter passado despercebida pelo matemático, conforme relatou o cientista Glen Van Brummelen à Nature.
Foi durante um curso de verão de matemática para estudantes do ensino médio, ministrado pelo pesquisador da Universidade Trinity West, no Canadá, que o uso da vírgula decimal nos tratados de Bianchini foi observado. Cabe lembrar que, para os falantes de inglês, as casas decimais são indicadas com ponto (como 1.5, por exemplo), enquanto em português utilizamos a vírgula (1,5).
A ideia de dividir números em partes menores é bastante antiga, porém a maioria dos matemáticos antes da Idade Média utilizava frações. Os astrônomos realizavam divisões, mas não no sistema de base dez que conhecemos atualmente, e sim na base 60, originada pela divisão de círculos de 360º em 60 minutos, os quais eram subdivididos em 60 segundos.
Em alguns momentos, matemáticos adotavam notações semelhantes ao sistema decimal, conforme Van Brummelen explica, porém tais ideias acabavam perdendo relevância antes de se popularizarem. Identificar o primeiro indivíduo a utilizar uma notação numérica é uma tarefa complexa, dependendo do que consideramos como um conhecimento transmitido de uma geração para outra e da constância desse sistema.
Descobrir a origem da vírgula decimal é mais simples e talvez mais válido, uma vez que a inovação perdura até os dias atuais. Bianchini foi o primeiro a empregar esse recurso no livro “Tabulae primi mobilis B”, uma obra que tratava do cálculo de coordenadas estelares. Enquanto desempenhava suas funções como administrador da família d’Estes, que reinava em Veneza naquela época, ele realizava cálculos de horóscopos e astrologia.
Foi por meio das tabelas desse trabalho que a vírgula decimal surgiu, exatamente como os matemáticos – e todos nós – a utilizamos atualmente. Embora tenha levado um tempo para se solidificar, Clávio eventualmente descobriu essa inovação, inspirando outros autores, até chegar a John Napier, o inventor dos logaritmos, que perpetuou a vírgula decimal na matemática no início do século XVII.
Fonte: Historia Mathematica, Nature
